Pesquisadores brasileiros se empenharam nos últimos anos
para compreender o maior episódio de extinção em massa da história da
Terra - que ocorreu na passagem do Permiano (o período situado entre 290
e 245 milhões de anos atrás) para o Triássico (entre 245 e 200 milhões
de anos).
A hipótese mais aceita é a de que eventos vulcânicos ocorridos
na Sibéria tenham alterado a composição química da atmosfera,
resultando em mudanças climáticas, alterações na circulação das
correntes marinhas e, por fim, a extinção em massa.
Em busca de pistas para entender melhor esse
momento-chave da história geológica, Max Cardoso Langer, professor do
Departamento de Biologia da Universidade de São Paulo (USP), campus de
Ribeirão Preto, foi a campo nos Estados que guardam os principais
depósitos do período Permo-Triássico brasileiro - Maranhão, Paraná e Rio
Grande do Sul.
Fósseis de vertebrados, invertebrados e até mesmo
vegetais desse período foram encontrados ao longo dos dois anos da
pesquisa, apoiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo
(Fapesp), entre 2010 e 2012.
Em rochas da Bacia do Parnaíba, no Maranhão, foi
localizada uma flora até então desconhecida. "Ela guarda uma semelhança
muito grande com as floras permianas da Europa, dos Estados Unidos e do
Sudeste Asiático.
É um detalhe técnico, mas muito interessante, pois
mostra que o norte do Brasil, naquela época, tinha uma biota mais
parecida com regiões ao norte do planeta do que com o restante da
América do Sul", disse Langer.
Outra descoberta feita na Bacia do Parnaíba extrapolou o
período de abrangência da pesquisa: acima das rochas do Permiano,
sedimentos de idade jurássica (de 200 a 145 milhões de anos) escondiam
um crânio de um crocodiliforme (parente fóssil dos jacarés atuais).
Em
terras brasileiras, todos os tetrápodes (animais com quatro patas) do
Jurássico eram conhecidos somente a partir de pegadas, tornando esse
achado o primeiro com base em esqueleto, segundo Langer.
A terceira entre as coletas mais significativas do
Maranhão foi a de vestígios de peixes do grupo dos semionotiformes do
período Permiano, animais que tinham por volta de 25 centímetros de
comprimento.
Eles eram conhecidos somente do Triássico em diante.
“Acreditava-se que tais peixes tinham surgido após a grande extinção.
Com o achado, vimos que, na verdade, eles pertencem a uma linhagem que,
por algum motivo, resistiu ao evento de crise e irradiou-se depois
dela”, disse Langer.
O material está na USP de Ribeirão Preto, em
análise por uma professora parceira, Martha Richter, do Natural History
Museum de Londres.
Descendo o território nacional, Langer e sua equipe
foram para a Serra do Cadeado, no norte do Paraná, onde também existem
rochas do período Permiano. Lá, encontraram peixes e anfíbios fósseis,
agora em vias de serem descritos.
"Achamos ainda vestígios de
trilobitas, que são artrópodes – animais com apêndices articulados e
exoesqueleto – de ambiente sempre marinho.
Não se imaginava que houvesse
influência do mar naquela região no período em que viveram esses
animais. Mas esta é uma evidência de que tal conexão existiu", disse o
pesquisador.
Na origem dos dinossauros
As investigações em rochas triássicas na depressão
central do Rio Grande do Sul ajudaram a descrever três espécies de
dinossauros: uma delas, o Pampadromeu (Pampadromaeus barberenai), pela primeira vez; e as outras duas, o Guaibassauro (Guaibasaurus candelariensis) e o Sacissauro (Sacisaurus agudoensis), ganharam descrições mais completas e detalhadas do que as existentes.
"Um dos aspectos que tornam essas descobertas tão
interessantes é que as rochas do Triássico do Rio Grande do Sul – assim
como as do noroeste argentino – reúnem os dinossauros fósseis mais
antigos de que se tem notícia em todo o mundo. Ou seja, estudá-los é
olhar para a origem desses animais, para seus primeiros momentos sobre a
Terra", disse Langer.
As buscas em solo gaúcho renderam ainda descrições de novos exemplares de tetrápodes do Triássico, como um rincossauro (Teyumbaita sulcognathus) e um rauisúquio (Decuriasuchus quartacolonia).
O primeiro foi um quadrúpede baixo, alongado, que passava dos dois
metros de comprimento na idade adulta e contava com uma estrutura
dentária própria para mastigar vegetais, provavelmente sementes.
Já os
rauisúquios eram os predadores de topo da época, comparáveis, em termos
de papel na cadeia alimentar, com os leões e os tigres atuais.
Hiato de Olson
O projeto envolveu outros cinco docentes e ao menos 15
alunos de instituições parceiras: Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (UFRGS), Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Universidade
Luterana do Brasil (Ulbra) e Universidade Federal do Piauí (UFPI).
Os
esforços investigativos seguem em frente, com o estudo do material
coletado. Ao longo dos próximos anos, isso permitirá traçar novas
relações de parentesco e preencher lacunas no registro fóssil das
espécies.
Os conhecimentos obtidos a partir de então podem
contribuir, de modo especial, com o preenchimento do chamado Hiato de
Olson, o período que se estende de 270 a 265 milhões de anos atrás
(dentro do Permiano), em que registros fósseis são mais escassos.
"Não
existe um motivo conhecido e aceito de forma consensual para tal
escassez. Pode ser somente pela escassez de rochas dessa idade", disse
Langer.
Fonte: Terra
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