sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Cientistas suíços revelam por que acreditamos em fantasmas



 
 
Experimento mostra que uma alteração dos sinais cerebrais envolvidos no autoconhecimento e no posicionamento do corpo no espaço causa esta ilusão.
 
 
Em 29 de junho de 1970, o montanhista Reinhold Messner teve uma experiência incomum. Ao contar a descida do cume Nanga Parbat (no lado ocidental dos Himalaias) com seu irmão, congelando, exausto, e na vasta paisagem árida sedento de oxigênio, ele relembra: “De repente, houve um terceiro alpinista com a gente ... um pouco à minha direita, um alguns passos atrás de mim, apenas fora do meu campo de visão”. Pacientes que sofrem de problemas neurológicos ou psiquiátricos também relatam com frequência sentir uma “estranha presença”. 
 
 
Exploradores, sobreviventes, pessoas que ficam viúvas descrevem uma presença invisível, semelhante a um anjo da guarda ou um demônio. Inexplicável, ilusória e persistente.  


Agora, a equipe de pesquisa de Olaf Blanke na da Escola Politécnica Federal de Lausanne (EPFL), na Suíça, revelou o que é esse fantasma.


Ao recriar a ilusão de uma presença semelhante no laboratório, eles mostraram que o “sentimento de uma presença” é, na verdade, uma alteração dos sinais cerebrais sensomotores, que estão envolvidos na geração de autoconhecimento através da integração de informações de nossos movimentos e posicionamento do nosso corpo no espaço.


No experimento, a equipe de Blanke interferiu na entrada sensomotora dos participantes de uma maneira que seus cérebros não pudessem identificar esses sinais como pertencentes ao corpo, e sim interpretá-los como externos. O trabalho está publicado na revista “Current Biology”.


Os pesquisadores primeiro analisaram os cérebros de 12 pacientes com distúrbios neurológicos – a maioria epilepsia — que tinham vivido esse tipo de “aparição”.


Análises de ressonância magnética por imagem dos cérebros desses pacientes revelaram interferência em três regiões corticais: córtex insular, córtex parietal-frontal e córtex temporo-parietal.


Essas três áreas são envolvidas no autoconhecimento, movimento e senso de posição no espaço. Juntas, elas contribuem para o processamento do sinal multisensorial, importante para a percepção do próprio corpo.


Os cientistas então fizeram um experimento “dissonante” no qual participantes vendados fizeram movimentos com as mãos na frente do corpo. Atrás deles, um dispositivo robótico reproduzia os movimentos, tocando as pessoas nas costas em tempo real.


O resultado foi uma espécie de discrepância espacial, mas por causa do movimento sincronizado do robô, o cérebro do participante foi capaz de adaptar e corrigir.






Depois, os neurocientistas introduziram um atraso temporal entre o movimento do participante e toque do robô. Nestas condições assíncronas, distorcendo a percepção temporal e espacial, os pesquisadores foram capazes de recriar a ilusão fantasma.


Os participantes não sabiam do propósito do experimento. Depois de cerca de três minutos do atraso do toque, os pesquisadores perguntaram o que os participantes tinham sentido.


Instintivamente, vários voluntários responderam “uma forte presença” e contaram até quatro fantasmas onde nenhum existia.
— Para alguns a experiência foi tão forte que eles pediram para parar — disse Giulio Rognini, um dos pesquisadores do projeto.


— Nossa experiência induziu a sensação de uma presença estranha em laboratório pela primeira vez. Isso mostra que ela pode surgir em condições normais, simplesmente através de sinais sensório-motores conflitantes — explica Blanke.


— O sistema robótico simula as sensações de alguns pacientes com transtornos mentais ou de indivíduos saudáveis sob circunstâncias extremas. Isso confirma que ela é causada por uma percepção alterada de seus próprios corpos no cérebro.


Além de explicar um fenômeno que é comum a muitas culturas, o objetivo desta pesquisa é entender melhor alguns dos sintomas de pacientes que sofrem de esquizofrenia.


Esses pacientes muitas vezes sofrem de alucinações ou delírios associados à presença de uma entidade alienígena cuja voz eles podem ouvir ou cujas ações eles podem sentir. Muitos cientistas atribuem essas percepções a um mau funcionamento dos circuitos cerebrais que integram informações sensoriais em relação aos movimentos do nosso corpo.


— Nosso cérebro possui várias representações do nosso corpo no espaço — acrescentou Giulio Rognini. — Em condições normais, é capaz de montar uma autopercepção unificada dessas representações. Mas quando o mau funcionamento do sistema devido a doença. - ou, neste caso, um robô - às vezes isso pode criar uma segunda representação do próprio corpo, que não é mais percebido como ‘eu’, mas como alguém, a ‘presença’ — explicou.


É pouco provável que estes resultados irão impedir ninguém de acreditar em fantasmas. No entanto, para os cientistas, é ainda mais evidências de que eles só existem em nossas mentes.





Fonte: O Globo

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