O Nordeste e o Sul do Brasil são as únicas regiões
onde a parcela da população católica ainda não caiu para um patamar
inferior a 70%, registrando uma redução mais lenta do que no resto do
país na última década.
O Censo 2010, divulgado pelo IBGE, confirmou a
tendência de queda do contingente católico no Brasil, que baixou para
64,6% da população, e o aumento dos evangélicos, que hoje representam
22,2%.
Os resultados da pesquisa sobre o perfil religioso brasileiro,
divulgados nesta sexta-feira, revelam que as regiões com a menor
proporção de católicos no Brasil são o Sudeste e o Centro-Oeste, ambos
com 59,5% de sua população autodeclarada católica.
Já no Nordeste e no Sul, a proporção de
católicos é de 72,2% e 70,1%, respectivamente, a maior taxa do país,
como ocorria no censo de 2000.
Por trás desses números estão não só questões da
fé, como também fatores sociais, econômicos e históricos da sociedade
brasileira.
O aumento da população evangélica, por exemplo,
acompanha a expansão da fronteira agrícola, evidenciando a influência de
deslocamentos populacionais no fenômeno.
"A mudança se dá no processo migratório", afirma
o cientista político Cesar Romero Jacob, professor da PUC-Rio.
"O
crescimento das igrejas evangélicas se dá basicamente na fronteira
agrícola e mineral do país e nas favelas e municípios de regiões
metropolitanas. O que há em comum entre esses dois elementos? Os
migrantes", ressalta ele.
Jacob desenvolveu a pesquisa "Atlas da Filiação Religiosa" com base nos dados do censo de 2000.
Ele considera que a chegada de migrantes a
periferias metropolitanas geram uma concentração de população em regiões
onde há ausência tanto do estado quanto da Igreja Católica, " que não
tem agilidade para deslocar padres e paróquias".
"Mas há as necessidades espirituais dos
imigrantes e a presença dos evangélicos, que são mais ágeis. Essa
combinação abre espaço para as pessoas aderirem a novas propostas
religiosas", afirma Jacob.
Para o pesquisador, as rupturas que ocorrem no processo migratório,
onde pessoas se desenraízam de suas comunidades, geram uma abertura para
mudar de religião.
O mesmo não ocorre em populações mais estabelecidas, seja nos grandes centros urbanos ou no interior rural.
"A tendência é as pessoas continuarem seguindo a mesma religião com a qual cresceram", diz. Assim, o catolicismo continua mais solidamente
implantado nas regiões de origem, e não de destino, de migrantes - como o
interior do Nordeste e de Minas Gerais - e também em uma área extensa
no Sul colonizada por comunidades católicas italianas.
De uma maneira geral, o contingente católico
continua mais forte em áreas rurais, com 78% da população; outros 15%
são evangélicos.
Já em áreas urbanas, 62% dos brasileiros são adeptos do catolicismo, enquanto 23,5% são evangélicos.
Os dados do censo mostram a evolução dos fiéis
brasileiros desde 1872, quando a filiação à religião católica apostólica
romana ainda era oficial no país, algo que perdurou até a Constituição
da República de 1891.
No primeiro século de estado laico brasileiro, a
mudança não foi grande: a proporção de católicos, que era de quase 100%
nos tempos de Dom Pedro II, caiu para 91,8% em 1970.
Foi a partir de 1980 que a queda se acentuou,
com o número de católicos baixando quase 10 pontos percentuais por
década até o patamar atual de 64,6%.
"Acho que esse movimento ainda vai continuar por algum tempo", considera o jornalista Luiz Paulo Horta.
"Mas depois deve se estabilizar e pode até gerar
alguma reação católica", acredita ele, autor de "A Bíblia: um diário de
leitura" (Editora Zahar) e imortal da Academia Brasileira de Letras. Assim como Jacob, Horta considera os aspectos sociológicos associados a essa mudança.
Ele aponta para fatores como a movimentação demográfica e a criação
de "bolsões de pessoas socialmente deslocadas" em cidades grandes ou
médias, deslocadas de seus ambientes originais. E carentes de um senso
de comunidade que os evangélicos foram mais ágeis em proporcionar.
"A Igreja Católica já sentiu o golpe. Está
levando essa pancada e acho que pode ter efeitos positivos, porque pode
passar a trabalhar com coisas mais autênticas e deixar de ser uma
afiliação tão tradicional", diz.
Esta "sacudida" pode contribuir para tornar a
igreja menos formal com o tempo, como já se vê com os padres
carismáticos que, aponta Horta, fazem parte do processo de buscar uma
linguagem nova.
Mas o declínio do peso do catolicismo na
sociedade brasileira é de certa forma uma consequência de sua hegemonia
no passado e está relacionado ao maior secularismo da sociedade atual,
onde a religião ocupa um espaço menor do que no passado.
"Uma palavra-chave hoje é o pluralismo", diz
Horta. Você tem mil ideias novas, cultos religiosos orientais, e as
pessoas se sentem mais abertas para escolher de um cardápio variado."
Os resultados do censo também refletem essa
pluralidade, com mais adeptos do espiritismo (hoje 2% da população
brasileira); mais pessoas que afirmaram seguir "outras religiosidades"
(2,7%); e um maior número de pessoas sem religião (8%). Dentre estes,
pela primeira vez, o censo especificou o número de ateus no país, que
chega hoje a 615 mil.
Destaques do Censo 2010 sobre o perfil religioso no Brasil
Católicos: Continuam sendo a maioria da população, mas baixaram de 73,6% em 2000 para 64,6% em 2010, ou 123 milhões de pessoas.
Evangélicos: A população evangélica foi a que mais cresceu. Os fiéis passaram de 15,4% em 2000 para 22,2%, ganhando 16 milhões de adeptos. O Brasil tem hoje 42,3 milhões de evangélicos.
Espíritas: O grupo aumentou de 1,3% para 2% na década, passando a abranger 3,8 milhões de brasileiros.
Sem religião:
O número dos que se declararam sem religião cresceu de 7,4% para 8%, um
aumento inferior ao registrado nas décadas anteriores. Em 1980, apenas
1,9% dos brasileiros se diziam sem religião.
Ascensão e queda: A
igreja que mais ganhou adeptos entre 2000 e 2010 foi a Assembleia de
Deus, que passou de 8,4 milhões para 12,3 milhões de fiéis. Já a Igreja
Universal do Reino de Deus perdeu quase 300 mil adeptos, passando de 2,1
milhões para 1,8 milhões.
Escolaridade: O
ensino fundamental incompleto é mais comum entre os católicos (40%), os
sem religião (39%) e os evangélicos pentecostais (42%). A menor
proporção está entre os espíritas (15%), entre o nível superior completo
é mais frequente (31,5%).
Dados do Censo 2010 do IBGE
Fonte: BBC
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