Minas Gerais já teve um clima quente e úmido, propício para o
desenvolvimento de florestas tropicais como a Amazônia, há 30 milhões de
anos, revelam 64 fósseis de 25 tipos diferentes de angiospermas,
plantas que têm sementes protegidas por frutos, da região centro-sul do
Estado. A descoberta foi feito pelo biólogo Jean Carlo Mari Fanton,
durante sua tese de doutorado na Unicamp (Universidade Estadual de
Campinas)
Para quem conhece o interior "montanhoso" de Minas Gerais, onde a temperatura é amena, até faz frio, fica difícil imaginar uma floresta quente e úmida ali, com características parecidas às da Amazônia.
Uma
pesquisa do Instituto de Geociências da Unicamp (Universidade Estadual
de Campinas) analisou fósseis de plantas que existiram no centro-sul do
Estado, para reconstruir como era o clima da região há cerca de 30
milhões de anos.
A "Amazônia mineira" que existiu ali pode ter
registrado temperatura média anual de até 28ºC e grande concentração de
chuvas - ela não é como a floresta Amazônica de hoje, mas uma ancestral
da Mata Atlântica.
A descoberta faz parte da tese de doutorado do biólogo Jean Carlo Mari
Fanton, sob orientação da professora Fresia Soledad Ricardi Torres
Branco, na área de paleobotânica, uma das subdivisões da paleontologia
voltada ao estudo dos fósseis de plantas.
Durante a pesquisa, foram analisados 64 fósseis de folhas de 25 tipos
diferentes de angiospermas, as plantas com sementes protegidas por
frutos, da região das bacias de Gandarela e Fonseca, entre as cidades de
Ouro Preto, Mariana e Belo Horizonte, perto da Serra do Caraça.
Ele
usou tanto os acervos do Museu de Ciências da Terra, e do Departamento
de Geologia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), como
também fez coletas de fósseis na região.
Trata-se de uma região com potencial paleontológico pouco estudada,
cujas folhas fósseis ficaram preservadas em depósitos de rios e lagos,
resultado de um processo especial e natural de preservação.
"Esse tipo
de estudo é importante para conseguir entender o nosso clima de hoje e
tentar fazer previsões, cenários futuros, sobre as mudanças climáticas.
Esta discussão é pertinente, pois a humanidade está queimando
combustíveis fósseis em um ritmo acelerado, sem conhecer muito bem as
consequências deste aumento dos gases de efeito estufa na atmosfera."
O biólogo escolheu estudar as angiospermas porque "várias famílias
deste grupo estão associadas a condições específicas, tornando-as bons
indicadores climáticos, como é o caso das famílias tropicais".
As
angiospermas formam hoje o maior grupo de plantas, com mais de 250 mil
espécies estimadas, vivendo em todos os tipos de ambientes. Mas a sua
maior diversidade é encontrada justamente nas florestas da região
tropical.
Pistas
Há 30 milhões de anos, na transição do Eoceno para o Oligoceno, a
disposição dos continentes era outra, afetando na dinâmica do clima: a
Cordilheira dos Andes estava se levantando, importantes rios ainda
corriam para o oceano Pacífico, as Américas do Norte e do Sul estavam
separadas, não havia tanto gelo nos polos, o mar avançava sobre regiões
do Norte e do Nordeste do Brasil e a Antártida tinha acabado de se
desconectar da América do Sul.
Além disso, havia grande concentração na
atmosfera de gás carbônico (CO2), resultado da intensa atividade
tectônica daquele período.
Os fósseis coletados foram analisados com estereomicroscópios e
microscópios, podendo observar a cutícula das folhas: glândulas e pelos,
por exemplo.
Verdadeiros "carimbos" e "impressões" foram deixados nas
rochas, revelando, em detalhes, a morfologia da epiderme, além da forma
de suas folhas.
"A estrutura auxilia a entender o ambiente no qual a planta habitou. As
formas encontradas foram moldadas pela seleção natural, para que a
espécie vivesse o melhor possível naquele ambiente", explica o
pesquisador.
A existência de folhas grandes e largas, com ápice estreito e alongado,
indica que chovia muito na região, segundo comparação com espécies das
mesmas famílias - com a evolução, as formas e estruturas mais vantajosas
foram sendo selecionadas.
Em florestas tropicais úmidas, por exemplo,
as plantas têm folhas em formato de "pingadeiras" para conduzir as gotas
de água até o solo, para serem usadas depois, diferentemente do que
acontece com plantas de regiões mais frias, como as tundras.
O biólogo analisou o tipo morfológico das folhas, as nervuras
encontradas, entre outros elementos, para identificar a família à qual
pertenceram e, para estimar as temperaturas, comparou essas folhas
fósseis com as folhas de outras espécies de angiospermas semelhantes,
que existem conforme algumas condições específicas de temperatura.
Ancestrais
Embora as plantas do passado guardem diferenças em relação às de hoje,
elas compartilham ancestrais com várias espécies que atualmente povoam a
Mata Atlântica, das famílias das mirtáceas (como jabuticabeiras e
goiabeiras) e das leguminosas (como o guapuruvu e o pau-brasil), entre
outras.
"Provavelmente, tínhamos em Minas Gerais uma floresta sempre
verde, parecida com a floresta Amazônica, ou com a floresta Atlântica
tropical ombrófila que temos na metade Norte do Brasil, em condições
quentes e úmidas."
Com a elevação de parte do território brasileiro, entre as
transformações registradas ao longo de milhares de anos, essa região de
Minas Gerais ficou mais fria e menos úmida.
Hoje, a média anual de
temperatura ali varia de 17ºC a 22ºC, bem abaixo da possível média de
28ºC de 30 milhões de anos atrás.
"Naquela época, provavelmente, existiram florestas tropicais úmidas na
região Sudeste. Isso pelo tipo de folhas que analisei, do mesmo tipo
morfológico que encontramos na região Amazônica. Não era a Amazônia
moderna, mas, sim, uma floresta com características ambientais
semelhantes, em outra região do país, e precursora da atual Mata
Atlântica."
O registro mais antigo de angiospermas é de 140 milhões de anos atrás,
quando ainda os dinossauros e as gimnospermas, as plantas com semente
desprotegida, reinavam absolutos na Terra. Somente entre 100 e 60
milhões de anos atrás é que as angiospermas e os mamíferos passaram a
dominar os ambientes.
Fonte: UOL
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