sábado, 11 de janeiro de 2014

No Altar de Maximón, o Deus Maia Bêbado e Demoníaco Adorado na Guatemala


Um santuário a Maximón em Santiago Atitlán, Guatemala. Todas as fotos por Benjamin Reeves.


Devotos em frente a uma estátua de Maximón em San Andrés Itzapa.


Xamãs queimam oferendas para Maximón em frente ao templo em San Andrés Itzapa. 


Dentro do templo em San Andrés Itzapa.


Dependendo de para quem você perguntar, Maximón é o diabo, um santo católico ou uma relíquia da religião maia pré-colonial. Mas todo mundo concorda em como ele se parece: é um cavalheiro elegante, de bigode, terno e chapéu preto.


É inconfundível, ele está sempre fumando um cigarro ou um charuto grande, e as casas de adoração a ele estão sempre repletas de velas acesas, garrafas de rum ou de álcool de cereais Quezalteca e outras oferendas de seus devotos.

“Ele é amigo dos santos”, um velho maia chamado Pablo me contou sobre Maximón enquanto caminhávamos por uma série de becos escuros, estreitos e enfumaçados no caminho até a casa de adoração da divindade na cidade de Santiago Atitlán, sul da Guatemala.

Santiago Atitlán é onde o culto a Maximón toma sua forma mais antiga e indígena. Aqui ele é raramente, ou nunca, referido como San Simon, que é como muitos católicos o chamam.


A estátua da entidade é guardada por um grupo de homens que se revezam para abrigá-la; todo ano, uma casa diferente é convertida em santuário para Maximón.

Como Maximón é tanto remanescente de uma fé antiga como uma figura venerada por muitos católicos, seus altares são coroados com todo tipo de imagens conflitantes — ícones da Virgem Maria, mas também animais empalhados pendurados no teto baixo.


Os sacerdotes, que falam com ele no dialeto maia Tz'utujil, estão constantemente bêbados de Quezalteca (uma parte necessária do processo), e o ar fica sufocante com a fumaça dos cigarros e charutos.

No dia em que visitei Santiago Atitlán, dois xamãs, completamente bêbados e vestindo roupas indígenas tradicionais, estavam ajoelhados de cada lado de um homem “doente da cabeça”, de acordo com Pablo.


Eles gesticulavam freneticamente entre pequenas garrafas de Quezalteca espalhadas pelo chão, rogando a seu deus que curasse o devoto.

Cenas assim são o motivo pelo qual a Igreja Católica tem Maximón em tão baixa conta. “Ele é o demônio”, um padre chamado Hugo Estrada disse recentemente para o jornal guatemalteco Prensa Libre.

Abelardo Ruiz Perez, líder da Arquidiocese de Solalá, uma área próxima a Santiago Atitlán, lar de muitos povos indígenas, disse: “Maximón é um fenômeno de grave corrupção religiosa... Só Deus sabe da destruição de almas e corpos”.

A Igreja considera oficialmente as preces a Maximón como bruxaria e lendas urbanas macabras sobre seus congregantes circulam entre a comunidade cristã — mesmo que muitos dos devotos de Maximón sejam católicos que o consideram um santo (ou, como Pablo entende, pelo menos do círculo social dos santos).


Acredita-se que o culto a Maximón começou por volta da época da conquista espanhola e cresceu na América Central quando o catolicismo criava raízes.


A designação de Maximón como santo católico é um caso clássico de sincretismo; San Simon permitiu que muitos maias continuassem com suas cerimônias e remédios tradicionais, mas participando da religião dominante dos colonizadores.


Não por acaso, o culto a Maximón deu às pessoas a possibilidade de pedir por bens materiais (uma prática geralmente não endossada pelo cristianismo) enquanto fumam charutos e bebem rum.

Mas sim, as orações para Maximón podem parecer bastante demoníacas. A Oracion del Puro (“Oração da Pureza” ou “Oração do Charuto”), pensada para garantir proteção pessoal, começa com uma invocação sinistra: “Te conjuro puro, em nome de Satanás, Luzbel e Lúcifer... Cães ladram, gatos uivam, crianças choram, e assim como tu conquistastes o coração de teu pai e de tua mãe, assim conquistastes o coração de [nome da pessoa] para mim, então vou cantando através de todas as regiões até a sétima região”.

No entanto, na maioria das vezes, Maximón é mais um deus transacional do que um demônio. A Oracion de las Siete Velas, um texto importante para os seguidores de Maximón, lista todas as coisas que as pessoas podem pedir a ele.


Velas verdes são associadas às quartas-feiras e ao planeta Mercúrio, e trazem “esperança; domínio sobre a pessoa amada; um bom resultado numa negociação comercial, num emprego ou na loteria; a cura de um vício ou más influências; e o exílio de coisas ruins”.


Velas pretas, por outro lado, são associadas aos sábados e à Júpiter, e são acessas para “confundir um inimigo, alguém que duvida, invejosos e traidores, e para a remoção de um vizinho ruim ou línguas murmurantes”.


O culto a Maximón varia muito de pessoa para pessoa e de lugar para lugar. San Andrés Itzapa, uma cidade não muito longe de Santiago Atitlán, é profundamente fascinada pelo deus, e em vez de santuários caseiros, os residentes construíram um enorme templo dedicado a Maximón do lado oposto da cidade à igreja católica.

Esse é um dos santuários mais populares de Maximón na região — pessoas de todas as partes da Guatemala, México, El Salvador e Belize vêm queimar oferendas a ele aqui. Do lado de fora, xamãs incendeiam pilhas de flores, milho e velas em sacrifícios públicos todos os dias.


Há uma cantina nas proximidades onde os peregrinos podem comprar velas coloridas, garrafas de Quezalteca e cigarros; uma placa entrega uma mensagem de Maximón: neste santuário, a negatividade não é permitida.


“Rogo que tu não venhas a mim com um punhado de velas buscando o mal contra teus irmãos, porque o dano que pedires a eles será dado a ti”, diz a placa. “Não me faças perder tempo vindo vestido de ovelha se por dentro fores um lobo.”

Os peregrinos fazem fila de um dos lados da principal sala do templo e se aproximam lentamente do altar, onde deixam rum, pão, Quezalteca, charutos ou dinheiro.


As paredes são decoradas com bandeirinhas de Natal (afinal de contas, é a época do ano), e velas multicoloridas cobrem fileiras de mesas simples de metal. Quando estive lá, uma banda de mariachis tocava hinos a Maximón ou San Simon — os nomes são intercambiáveis aqui.


Aqueles que tiveram suas preces atendidas compram placas em relevo para pendurar no templo. Essas placas em geral incluem os nomes dos devotos, o lugar de onde são e o que pediram.


Elas comemoram todo tipo de favores: ajuda no amor, boa saúde ou sucesso nos negócios. “Obrigado pelo dinheiro”, é uma das mais populares, assim como “Obrigado, San Simon, pela nova motocicleta”.

Curiosamente, a imprensa guatemalteca afirma que o culto a Maximón tem declinado nas últimas décadas devido ao rápido crescimento das igrejas evangélicas, mas isso é difícil de ser medido com certeza. Em todo caso, ele continua uma figura poderosa em Santiago Atitlán e San Andrés Itzapa.


E é fácil entender o porquê: o governo do país parece impotente para dar um fim à pobreza, corrupção e violência que assolam o país, e Jesus não é o cara para quem você pede uma moto nova. Maximón é um condutor psicológico útil para muitas pessoas que querem expressar o desejo de uma vida melhor.

Assim, todo o aspecto de magia negra também ajuda. Um morador de Santiago Atitlán, Marcos Lopez, explicou à Prensa Libre o motivo pelo qual muitas pessoas têm medo de se livrar de suas estátuas pessoais de Maximón: “Verdade ou não, aqui as pessoas acham que se você parar de cultuá-lo, isso pode trazer azar. Outros acreditam que nada acontece. Para estar seguro, é melhor deixá-lo em paz”.




Fonte: Vice

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