sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Túmulos revelam detalhes da ocupação muçulmana da França


As três sepulturas foram descobertas na cidade medieval de Nimes, no sul da França (ilustração). A descoberta mostra o quão longe a fé muçulmana se espalhou em pouco mais de um século desde que foi fundada


Os testes genéticos nos três esqueletos revelaram que eram berberes, o grupo que vivia no Norte da África. Eles foram conquistados pouco antes pelo império islâmico Umayyad e apareceram rapidamente integrados em seus exércitos após a conversão a fé islâmica ( foto: cavaleiros berberes em seus camelos)

Os esqueletos dos três indivíduos foram encontrados em túmulos que datam do século 7 dC (foto) foram  enterrados de uma maneira que se seguia os preceitos islâmicos, orientando seus corpos e cabeças em direção a Meca. O teste de DNA revelou também que o trio era do norte da África, dominado pelos muçulmanos Omíadas


A queda do Império Romano do Ocidente, no século V d.C., fragmentou a Europa, mergulhando o continente nas trevas da Idade Média, numa época marcada pela desurbanização, redução da população e conflitos entre os muitos pequenos reinos que se organizaram na região e contra invasores externos. 


Menos de 200 anos depois, porém, uma nova potência emergia na esteira do surgimento de uma nova religião, o islamismo, que nos séculos seguintes se expandiu do Oriente Médio para ocupar desde a fronteira da Índia até a Península Ibérica. E embora a presença muçulmana nos territórios de hoje Portugal e Espanha seja bem conhecida e documentada, pouco se sabe sobre sua expansão para além dos Pirineus, cadeia de montanhas que separa a área do Sul da França. 


Mas a recente descoberta de três túmulos com características islamitas na cidade francesa de Nimes joga uma nova luz neste obscuro período da História.


Datados do século VIII, as sepulturas e restos mortais, inicialmente desencavados entre 2006 e 2007, foram alvo de uma análise multidisciplinar que envolveu arqueologia, antropologia, história e genética para determinar as origens de seus ocupantes. 


E, segundo os cientistas liderados por Yves Gleize, do Instituto Nacional de Pesquisas Arqueológicas Preventivas da França (Inrap), os estudos indicam que de fato eles pertencem a prováveis integrantes da etnia norte-africana bérbere parte do exército do califado Omíada, que tomou Nimes no início dos anos 700, representando os mais antigos túmulos de muçulmanos já encontrados ao Norte dos Pirineus.


- As análises arqueológica, antropológica e genética conjuntas desses três antigos túmulos medievais em Nimes evidenciam enterros ligados à ocupação muçulmana do Sul da França no século VIII – resume Gleize.


Ainda de acordo com os pesquisadores, a descoberta ecoa em especial as fontes textuais disponíveis que indicam umas poucas décadas de presença muçulmana em Nimes entre 720 e 752 d.C..


“Sugerimos que as sepulturas discutidas nesse estudo podem fornecer mais detalhes sobre esta presença muçulmana. De fato, a descoberta de ritos funerários fiéis aos costumes muçulmanos indicam a presença de uma comunidade que era familiarizada e praticava o islamismo em Nimes durante esse período”, destacam os autores no artigo sobre o estudo, publicado na quarta-feira no periódico científico on-line de acesso aberto “PLoS One”.


Mas além de confirmar registros documentais históricos, os cientistas acreditam que os túmulos são importantes pistas para a natureza da relação dos primeiros conquistadores muçulmanos da Europa com os povos das regiões tomadas. 


Segundo eles, mesmo que breve, a ocupação de Nimes poderia ter sido do interesse da própria população visigoda da região como forma de proteção contra os francos, ao mesmo tempo que puderam manter suas leis e tradições sob a dominação islâmica. 


Ainda assim, os francos acabaram por conquistar a área na segunda metade do século VIII sob a liderança do rei Pepino, o Breve, mais conhecido por ter sido o pai de Carlos Magno. Por fim, os cientistas apontam que a origem étnica bérbere dos corpos é uma demonstração do quão rápidas foram a aceitação da nova religião islâmica pelas populações do Norte da África e sua integração ao crescente califado.


“Mesmo que as descobertas funerárias em Nimes não respondam todas as questões, elas apoiam a ideia da complexidade das relações entre essas comunidades durante este período, que não podem ser resumidas na simples oposição entre cristãos e muçulmanos, e estão longe da descrição clichê ainda encontrada em alguns livros de História”, concluem os pesquisadores do artigo.





Fonte: Extra

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