Um clube seleto, cujos associados se resumiam a poucos mamíferos altamente sociáveis e de cérebro avantajado, acaba de ser invadido por uma ave. Um trio de pesquisadores da Alemanha demonstrou que a pega-européia (Pica pica), prima das gralhas e dos corvos, também consegue se reconhecer no espelho.
A capacidade, considerada um dos embriões da autoconsciência tão prezadas pelos seres humanos, comprova de vez a elevada inteligência dos corvídeos, como são conhecidos esses pássaros.
A pesquisa, publicada na revista científica de acesso livre "PLoS Biology", foi conduzida por Helmut Prior, da Universidade Goethe, e Ariane Schwarz e Onur Güntürkün, da Universidade do Ruhr em Bochum. Os três observaram o comportamento de cinco pegas criadas em laboratório, conhecidas como Gerti, Goldie, Schatzi, Lilly e Harvey.
Até hoje, a capacidade de se reconhecer no espelho havia sido demonstrada apenas entre grandes macacos (chimpanzés, bonobos e orangotangos), golfinhos e elefantes.
O consenso entre os especialistas em comportamento animal -- ou etólogos, como são chamados -- é que, para ser capaz desse feito, a espécie em questão deve possuir um bom grau de empatia e de consciência social. Isso porque, ao entender com clareza a diferença entre si mesmo e o outro, um indivíduo automaticamente conseguiria criar uma autoimagem a ser reconhecida no espelho.
Testar esse tipo de capacidade não poderia ser mais simples. O primeiro passo, lógico, é colocar os bichos frente a frente com seu reflexo.
Mas o teste definitivo envolve a colocação de uma marquinha artificial, preferencialmente de cor forte, no corpo do animal, num local que só pode ser visto com a ajuda do espelho.
Se ele tentar tocar a "pinta" ou procurar retirá-la, é sinal de que conseguiu relacionar a presença da marca colorida com o seu próprio corpo. (Em chimpanzés, o mais usual é pintar o bicho com batom.)
No caso das pegas, os pesquisadores alemães usaram "pintas falsas" de cor amarela, não sem antes ver como os bichos reagiam ao espelho.
Três deles mostraram estar começando a se reconhecer, indo para a frente e para a trás, agindo com curiosidade, diante da imagem, enquanto outros dois tentaram atacar ou até cortejar o "outro pássaro". (Entre chimpanzés, também não são todos os indivíduos que entendem a brincadeira.) E, finalmente, duas pegas também usaram o bico e as patinhas para tentar arrancar a falsa pinta.
Os pesquisadores sugerem que essa capacidade rara surgiu entre os corvídeos graças, acredite ou não, à necessidade de ficar um passo à frente dos ladrões. É que as pegas costumam guardar comida em lugares específicos para consumo posterior, ficando sempre de olho nos companheiros de espécies que viram a "estocagem" e poderiam roubá-las.
Isso teria turbinado sua capacidade de assumir perspectivas e ter empatia -- justamente o necessário para se reconhecer no espelho.
Fonte: G1
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