Por sob as camadas de nuvens que giram velozmente em torno do planeta, Júpiter talvez abrigue um núcleo sólido com massa equivalente a 16 vezes a da Terra - mais que o dobro da dimensão que os cientistas estimavam anteriormente para a porção central do astro.
Essa foi a conclusão de um novo e controvertido projeto de simulação por computador que representa a primeira reconsideração radical quanto à questão do núcleo do planeta em cerca de duas décadas. O trabalho redespertou o debate entre os cientistas planetários sobre a maneira pela qual planetas gigantes gasosos como Júpiter teriam se formado inicialmente.
"A maior surpresa foi a presença de um núcleo tão grande", disse o diretor científico do projeto, Burkhard Militzer, da Universidade da Califórnia em Berkeley. "Nós concluíamos que o planeta se deve ter formado por um processo de acreção de núcleo", quando a colisão de grãos de poeira, gelo e pequenos corpos planetários resultou na formação de uma massa por união e fusão para criar embriões planetários e por fim planetas plenamente desenvolvidos.
O centro da questão
Muitos cientistas acreditam que a acreção de núcleo é um bom modelo para o nascimento de planetas rochosos semelhantes à Terra. Mas aplicar esse modelo ao desenvolvimento de planetas gigantes gasosos sempre foi difícil, porque as simulações em computador sempre sugeriram que suas dimensões são tão grandes e eles abrigam tanto gás que não haveria como terem crescido até o seu tamanho atual no período que separa a formação de seu núcleo do momento atual.
Uma das principais teorias alternativas, defendida por Alan Boss, da Carnegie Institution, em Washington, é a da instabilidade de disco. Isso aconteceria quando nuvens de gases dentro de um disco de material de formação de planeta no interior de estrela jovem se resfriam e entram em colapso, formando planetas gigantes gasosos. Mas caso Júpiter de fato apresente um núcleo rochoso bem maior do que se estimava anteriormente, diz Militzer, o modelo da acreção passa a ser uma explicação mais aceitável.
O estudo surgiu apenas dois anos antes da data prevista de lançamento para uma missão recentemente aprovada pela Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço (Nasa) dos Estados Unidos, o projeto Juno, que talvez seja capaz de colocar um ponto final na disputa iniciada há algumas décadas.
"A verdadeira surpresa que poderia surgir da missão Juno seria que ela constatasse que na verdade Júpiter não tem núcleo algum", disse Boss. "Caso isso venha a acontecer, os dois modelos mais aceitos quanto à formação de Júpiter estariam desacreditados".
Para seu estudo, Militzer e seus colegas usaram modelos avançados de simulação computadorizada a fim de considerar alterações na temperatura, densidade e pressão em diversos pontos, até bem fundo no interior do planeta.
A simulação deles também utilizava dados sobre o tamanho e o campo gravitacional de Júpiter obtidos em viagens anteriores de exploração espacial, de acordo com William Hubbard, co-autor do trabalho e professor da Universidade do Arizona. Detalhes sobre a simulação foram publicados em uma edição recente da revista científica Astrophysical Journal Letters.
Militzer acredita que, depois de sua acreção original, o núcleo recém-formado do planeta Júpiter tenha percorrido uma trajetória considerável pelo Sistema Solar, e durante o percurso recolhido a maior parte do gás disperso que restava no sistema depois da formação do Sol, cerca de 4,6 bilhões de anos atrás. Com base nessa idéia teriam sido necessários apenas 10 milhões de anos para que Júpiter acumulasse suas dimensões atuais, equivalentes a 318 vezes a massa da Terra. Boa parte da massa do planeta é composta pelos gases hidrogênio e hélio.
Mas Hubbard não está pronto para endossar qualquer teoria definida, no momento.
"Não existe acordo nem mesmo entre os especialistas em modelagem quanto ao que está acontecendo em Júpiter", disse ele. "Não defendo de maneira intransigente a teoria de que Júpiter tenha sido necessariamente formado em um processo de acreção de núcleo. Isso representa apenas uma avaliação razoável dos resultados que obtivemos com os nossos modelos. Com a missão Juno, eu gostaria de obter um diagnóstico que demonstre a assinatura de um núcleo, talvez na forma de padrões de circulação do planeta ou talvez pela presença de um campo magnético de forma determinada".
Um salto quântico
A missão Juno deve ser lançada em 2011. Quando chegar a Júpiter, em 2016, a espaçonave acionada por energia solar adotará uma órbita polar altamente elíptica. Durante cerca de um ano, a Juno mapeará os campos magnéticos e gravitacionais de Júpiter com instrumentos de alta precisão, e ao mesmo tempo tentará observar de maneira profunda a atmosfera do planeta.
Adam Burrows, astrofísico da Universidade de Princeton que não tem qualquer conexão com a missão, disse que o projeto Juno representaria "um salto quântico" para a compreensão dos planetas gigantes em geral.
Melhores dados sobre do núcleo de Júpiter, por exemplo, poderiam dar aos pesquisadores novas informações sobre a formação dos mais de 200 planetas gigantes gasosos que foram localizados em órbita de outras estrelas. Mas Ravitt Helled, membro da equipe científica do projeto Juno, que tem por sede a Universidade da Califórnia em Los Angeles, disse que a massa do planeta teria de ser ou muito grande ou muito pequena para revelar informações sobre sua formação.
Boss, da Carnegie Institution, acrescentou que é possível que o núcleo de Júpiter se tenha erodido com a passagem do tempo. Caso isso se confirme, existe a possibilidade de que as informações necessárias a resolver o dilema tenham desaparecido por ação da erosão.
Fonte: Terra
Nenhum comentário:
Postar um comentário