segunda-feira, 7 de março de 2011

Pesquisador: legislação ambiental impulsionou arqueologia


Uma obra de centenas de milhões de reais de repente é interrompida por causa de... alguns cacos de cerâmica. Pois o que para alguns pode parecer lixo, para a arqueologia pode significar um verdadeiro tesouro e revelar a história de uma região.

Segundo o arqueólogo e professor da Unicamp, Pedro Paulo Funari, a restauração da democracia em 1985 e as mudanças na legislação, principalmente na ambiental, que levaram os arqueólogos a inspecionar as grandes obras, alavancaram essa área de pesquisa no Brasil.

"O panorama da arqueologia no Brasil está muitíssimo melhor. Primeiro, porque os arqueólogos puderam ficar em contato com seus colegas estrangeiros e aproximar a disciplina da sociedade, com a introdução de temas de relevância social e política, como Palmares, Canudos.

Também a legislação de proteção ambiental passou a exigir a atuação arqueológica na construção de estradas, barragens e edifícios, de modo que as pesquisas ligadas a licenciamento ambiental e histórico são numerosas e empregam um número crescente de arqueólogos", explica.

Na opinião do pesquisador, antes da redemocratização, o Brasil possuía poucas leis para a proteção ambiental, e sua implementação era fraca.

"Uma estrada como a Rio-Santos, por exemplo, trouxe imensos impactos ambientais e inúmeros sítios arqueológicos foram destruídos, quando da sua construção".

Mas a Constituição de 1988, em especial o artigo 216, mudou esta realidade, protegendo áreas e objetos até então negligenciados.

O texto afirma que o patrimônio cultural brasileiro "é constituído por bens de natureza material e imaterial, tombados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade".

A partir de então, diversas descobertas foram feitas em obras que possuíam a presença de um arqueólogo. Entre elas, Funari cita as pinturas rupestres em Estados como Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso.

Os chamados sítios históricos, locais de ocupação por parte dos colonizadores entre o ano de 1500 e o final do século XIX, também foram muito abundantes, como vestígios dos colonizadores - dos bandeirantes na construção do Rodoanel, na altura do Pico do Jaraguá, por exemplo.

Mas nem sempre as obras são feitas longe dos centros urbanos. No ano passado, o processo de reurbanização do largo de Pinheiros, em São Paulo, foram interrompidas devido à descobertas arqueológicas.

Entre os 20 mil objetos encontrados estão louças, porcelanas Maastrich e Sarreguemines, garrafas de vinho e uísque - todos importados - e cerveja holandesa, apontando a presença de uma antiga taberna no local. Um grande cocho para os animais beberem água também foi desenterrado.


Melhorar a legislação


Mesmo com o resultado positivo que a legislação trouxe à área, o pesquisador acredita que ainda há espaço para avanços.

"É importante fortalecer a fiscalização, para que as pesquisas arqueológicas sejam realmente bem feitas e seus resultados divulgados para os estudiosos e para o público leigo em geral", diz.

O arqueólogo também cita a questão das descobertas subaquáticas, normalmente esquecidas por quem se interessa por pesquisa e atualmente negligenciada pela legislação.

Sítios arqueológicos subaquáticos abrigam a cultura material e podem ser constituídos de cidades ou sítios terrestres que foram alagados, sambaquis (aterros feitos por populações pré-históricas que viveram entre oito mil e mil anos atrás), além dos restos de naufrágios.

Para liderar as pesquisas do setor, o Brasil conta com o Centro de Estudos de Arqueologia Náutica e Subaquática (Ceans), fundado em 2000 pelos arqueólogos Gilson Rambelli, Paulo Fernando Bava de Camargo e Flávio Rizzi Calippo.

Quatro anos depois, o Ceans passou a fazer parte do Núcleo de Estudos Estratégicos (NEE-Unicamp), sendo então reconhecido nacional e internacionalmente como o primeiro centro brasileiro especializado nesse tema.

A instituição condena a retirada de objetos de sítios arqueológicos para a exploração comercial, pessoal ou para mera ilustração da história e orienta sobre como proceder caso se encontre algum vestígio histórico submerso. Confira as dicas:

1 - Não remova nada;
2 - Faça alguma marcação do local (posicionamento), embaixo d'água e na superfície, para saber voltar ao ponto encontrado;
3 - Comunique imediatamente a Autoridade Marítima e ao Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional): www.iphan.gov.br.


Fonte: Terra

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