Hipopótamos pigmeus
africanos de zoológico estariam favorecendo o nascimento de fêmeas por
meio de mudanças nos espermatozoides. (foto: Saragusty)
Pesquisa mostra que hipopótamos pigmeus machos em cativeiro
são capazes de ajustar a proporção de cromossomos sexuais de seu esperma
para manipular o sexo da cria. A estratégia pode estar presente em
todos os mamíferos, inclusive humanos.
Vai ser menino ou menina? A clássica pergunta é uma incógnita para
qualquer pai antes dos resultados do exame de ultrassom ou de sangue.
Afinal, as chances são as mesmas para cada um, certo? Não para os
hipopótamos pigmeus.
Uma pesquisa de biólogos alemães e ingleses sugere
que os machos da espécie possuem um mecanismo capaz de modificar a
proporção de espermatozoides carregando cromossomos sexuais femininos
(X) e masculinos (Y), de modo a favorecer o nascimento de filhotes de um
dos sexos.
No caso dos hipopótamos estudados, todos de zoológicos, a preferência
era pelas meninas. Por meio de uma pesquisa bibliográfica, os biólogos
da Sociedade Zoológica de Londres e do Instituto Leibniz de Pesquisa de Zoológico e Vida Selvagem
perceberam que nos últimos 100 anos a quantidade de fêmeas nascidas em
cativeiro pelo mundo foi muito superior a de machos: 68% dos 1.057
filhotes registrados no período.
A discrepância foi o que os motivou a entender o processo por trás da
determinação do sexo das ninhadas. De acordo com o biólogo especialista
em reprodução animal Felipe Zandonadi, da Universidade Federal
Fluminense (UFF), esse campo de estudo é pouco explorado.
“Ainda não são bem compreendidos os mecanismos por trás de uma
possível determinação sexual e as pesquisas geralmente se concentraram
nas fêmeas, apesar de o macho ter um papel importante na determinação do
sexo”, afirma.
Na contramão dessa tendência, os pesquisadores resolveram estudar os
machos para ver se eles não tinham algum papel nesse processo. Eles
analisaram o esperma de 10 hipopótamos pigmeus em cativeiro e
descobriram que todos eles produziam mais espermatozoides com
cromossomos femininos que masculinos.
Teoricamente, a proporção deveria ser a mesma, pois cada célula
progenitora dá origem a quatro espermatozoides, dois com cromossomos
femininos e dois com masculinos.
“Naturalmente, o macho não tem controle sobre o destino de sua
ejaculação depois do acasalamento, mas ao ejacular mais espermatozoides
de certo sexo, ele aumenta a probabilidade de que um deles fertilize o
óvulo”, explica o biólogo Joseph Saragusty, do Instituto Leibniz de
Pesquisa de Zoológico e Vida Selvagem e líder da pesquisa.
De acordo com o pesquisador, o mecanismo poderia, em teoria, ser
usado tanto para favorecer um sexo quanto o outro. No caso dos
hipopótamos do zoológico, ele acredita que a escolha pelas fêmeas seja
uma estratégia dos machos para reduzir a competição sexual com outros
machos que compartilham o cativeiro.
“Na natureza, os hipopótamos pigmeus são animais extremamente
territoriais e a luta é severa se há um invasor“, conta. “Já os
zoológicos abrigam mais de um animal juntos, criando a noção de alta
densidade populacional. Sob essas condições, é mais interessante para os
machos que não nasçam outros machos para competir por espaço e fêmeas.”
Forma de conservação
Os pesquisadores ainda não sabem explicar que processo leva à
diferença de quantidade de espermazoides femininos e masculinos. Mas
apostam que o mecanismo por trás disso seja ativado ainda quando os
gametas estão sendo produzidos no tecido do testículo.
Apesar das incertezas sobre a questão, Saragusty acredita que o
mecanismo pode estar presente em qualquer mamífero, inclusive nos
humanos.
“Na maioria dos países, nascem mais homens que mulheres”,
pontua. “Como isso acontece, ninguém sabe e ninguém nunca checou se uma
mudança na proporção de espermatozoides é a causa, pois para fazer esse
teste em humanos existem muito mais complicações.”
Na natureza, os hipopótamos pigmeus são solitários; nos zoológicos, a
densidade populacional pode ser a causa da preferência dos machos por
filhotes fêmeas. (foto: Raimond Spekking)
O cientista, que publicou a pesquisa na Nature,
pretende conduzir mais testes com outros animais para ver se o processo
de determinação sexual está presente.
Segundo ele, a descoberta do
mecanismo completo pode ser útil para a conservação de espécies
ameaçadas, como o próprio hipopótamo pigmeu.
“Para quem trabalha com conservação de animais silvestres, um dos
maiores problemas é que as ninhadas não são suficientes para manter a
população”, diz.
“Para driblar esse obstáculo, seria ótimo se pudéssemos
fazer os animais produzirem mais fêmeas que machos, tendo mais fêmeas
para dar à luz novos animais.”
Fonte: Ciência Hoje
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