Em abril deste ano, foi identificado, pela primeira vez, um sítio
arqueológico do tipo polidor e amolador fixo no interior do estado do
Rio de Janeiro, mais precisamente, na fazenda Santa Inês, no município
de Miracema, no noroeste fluminense.
Segundo a arqueóloga Nanci Vieira
de Oliveira, professora do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), os sítios
arqueológicos são locais onde ficaram preservados objetos, construções
ou outras evidências de atividades humanas no passado.
“No caso do polidor e amolador fixo, trata-se de um sítio tipo oficina,
no qual os homens elaboravam artefatos, como machados, em suportes de
grandes blocos ou superfícies rochosas, deixando várias marcas de
polimento ou amolação no local”, explica.
Nanci destaca que era
uma unanimidade entre os arqueólogos que, no estado do Rio de Janeiro,
esse tipo de sítio ocorria, exclusivamente, no litoral, como em Cabo
Frio e em Angra dos Reis.
Com a descoberta, segundo a pesquisadora, o
passo seguinte será fazer um mapeamento georreferenciado da região para
encontrar outros sítios semelhantes e, possivelmente, algum sítio de
habitação que forneça informações sobre o padrão de subsistência, as
tecnologias usadas, as formas de moradia e, caso haja sepultamento,
poderia-se até saber a morfologia do corpo humano daquela população.
Oito
estudantes do ensino médio, moradores de Miracema, foram selecionados
para trabalhar na pesquisa, recebendo bolsa Jovens Talentos, da FAPERJ.
“Vamos dar suporte teórico e deixar tarefas pré-determinadas, além de
oferecer palestras sobre identificação de vestígios arqueológicos. A
cada encontro, os alunos vão apresentar relatórios e resultados.
Nossa
maior preocupação é enfatizar a necessidade de sinalizar as peças
encontradas, sem retirar absolutamente nada do lugar. Em visitas
periódicas, vamos confirmar a descoberta, para, em seguida, pedir
autorização ao Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(Iphan) para fazer intervenções, retiradas de peças e escavações no
local.”
Montando a história de Miracema
Segundo
Nanci, os sítios arqueológicos são importantes porque ajudam a
reconstruir o passado, tanto que, no Brasil, são considerados patrimônio
nacional, protegidos por lei, sob a responsabilidade do Iphan.
“Temos
uma vasta bibliografia de viajantes, descrevendo os habitantes do
noroeste fluminense e seus hábitos, a partir da segunda metade do século
XVIII, quando o interior do Rio de Janeiro começou a ser ocupado. Ao
que tudo indica, tratava-se de uma população indígena da etnia puri.
Depois, a mesma região de Miracema, já com trabalho escravo, passou pelo
ciclo do açúcar, pela produção de café e de algodão. Os resquícios
arqueológicos são fundamentais para montar todo esse quebra-cabeça”,
aposta a pesquisadora.
Como Nanci explica, inicialmente foram
traçadas três linhas de pesquisa: a primeira é buscar a identificação
dos vestígios arqueológicos pré-coloniais, para confirmar, ou não, a
ocupação indígena puri; a outra é fazer um levantamento bibliográfico
das características socioeconômicas da expansão colonial, buscando
discutir de que maneira a região se transformou em uma cidade
independente, depois do desenvolvimento da indústria têxtil; e, por
último, traçar uma arqueologia da memória, ou seja, entrevistar os
idosos da região, preferencialmente os descendentes de índios, escravos e
colonizadores.
Na verdade, o sítio arqueológico da fazenda
Santa Inês foi descoberto em dezembro de 2011, durante a XIII Jornada
Científica do Projeto Jovens Talentos para a Ciência.
“Estava programada
uma visita à fazenda para que os jovens conhecessem alguns aspectos
culturais e históricos da região. Dois jovens do programa, Charles
Gloria e Paulo Reynaldo, que já trabalharam com arqueologia em Angra dos
Reis, identificaram características que levavam a crer que o local
podia ser um sítio arqueológico. Em abril, fomos até lá e confirmamos”,
revela Nanci.
Destinado a estudantes do ensino médio ou técnico
da rede pública estadual de educação, o Jovens Talentos para a Ciência é
o programa de pré-iniciação científica, da FAPERJ em parceria com a
Fundação Centro de Educação a Distância do Estado do Rio de Janeiro
(Cecierj).
O objetivo é estimular, nos alunos, o interesse pela ciência e
tecnologia e identificar o potencial para atuar em pesquisa, além de
contribuir para a difusão dos conhecimentos científicos, desmistificando
a ciência e articulando pesquisa e ensino.
A pesquisadora
ressalta que a participação dos estudantes de Miracema no mapeamento dos
sítios arqueológicos é fundamental para se criar estratégias de
preservação junto as comunidades e as autoridades.
“Por desconhecerem o
assunto e sua importância, muita gente destroi ou pega artefatos
arqueológicos. Estimular a educação patrimonial nos jovens é o primeiro
passo para que o conhecimento se espalhe. Os estudantes se engajam no
projeto e passam esses conceitos aos membros da família e amigos”,
afirma Nanci.
Ela destaca a parceria com o professor Julio Cralia, da
Universidade Federal Fluminense (UFF), campus de Campos dos Goytacazes, e
do professor Jorge Belizário de Medeiros Maria, responsável pelo
programa Jovens Talentos, na FAPERJ.
Fonte: Planeta Universitário
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