Foto antiga documenta cultura cigana
Terceiro / Reprodução
Comunidade centenária que vive na Terra Santa sofre com isolamento,
pobreza e analfabetismo. Além de melhorar as condições sociais,
ativistas querem preservar uma cultura milenar.
Eles se denominam dom, que significa “homem” em sua língua
tradicional, ou domari. Entre os árabes, porém, são chamados
pejorativamente de nawar: os sujos.
Estigmatizados e isolados, os
ciganos de Jerusalém enfrentam o analfabetismo e a pobreza na cidade
sagrada para judeus, cristãos e muçulmanos.
A comunidade centenária, que
hoje conta apenas com 1,7 mil pessoas, começa a se abrir para o mundo
na tentativa de salvar sua cultura e ser reconhecida como uma etnia à
parte em meio ao interminável conflito entre israelenses e palestinos.
—
Ninguém nos aceita realmente. Para os árabes, somos diferentes. Já para
os judeus, somos árabes. Vivemos um dia a dia de discriminação e
isolamento — conta a ativista cigana Amoun Sleem, fundadora da Sociedade
Domari de Ciganos de Jerusalém, a primeira ONG cigana de Israel, criada
em 2004.
Se os ciganos de Jerusalém são um pequeno grupo em meio
aos 700 mil moradores da cidade, não estão sozinhos no Oriente Médio. Há
cerca de 2,2 milhões de ciganos em toda a região.
O maior número pode
ser encontrado no Egito (mais de 1 milhão). Mas também há comunidades no
Iraque, na Síria e na Jordânia, entre outros países.
Esse número também
inclui algo entre três e seis mil ciganos palestinos na Faixa de Gaza e
outros dois mil na Cisjordânia. Enquanto os primos europeus, os roma,
professam o Cristianismo, eles são muçulmanos. E a ascendência indiana
pode ser vista nos traços do rosto e na cor da pele.
As origens
dos ciganos de Jerusalém ainda é envolta em mistério. A comunidade não
tem história escrita, apenas folclore oral.
A maioria dos pesquisadores
concorda que eles são descendentes dos ciganos do Noroeste da Índia, um
povo nômade que surgiu há cerca de 1,5 mil anos e que posteriormente se
espalhou por todo o mundo. Além dos ciganos do Leste Europeu, também há
comunidades na Austrália e nas Américas (no Brasil, são cerca de 1
milhão de pessoas).
No caso do Oriente Médio, as primeiras
migrações parecem datar do século XI. Chegaram em Jerusalém em meados do
século XIX. Depois disso, as caravanas com nômades vestidos com roupas
típicas ficaram no passado. Os ciganos da Terra Santa são há tempos
sedentários.
Metade da comunidade de Jerusalém vive dentro da
Cidade Velha, numa área de um quilômetro quadrado dividida em quatro
bairros onde ficam os principais pontos sagrados da cidade, como o Muro
das Lamentações.
A outra metade vive no bairro de Shuafat, próximo à
Cidade Velha. Estes ciganos se vestem e se comportam como o resto da
população árabe-israelense da cidade.
— Temos medo de parecer
diferentes nas ruas. Por isso, acabamos assimilando os costumes locais e
perdemos, aos poucos, os nossos. É uma pena — diz Amoun Sleem. — Quero
recuperar o orgulho do meu povo.
No passado, os ciganos dom de
Jerusalém eram reconhecidos treinadores de cavalos, ferreiros ou
alfaiates. As mulheres eram renomadas cantoras, dançarinas e artistas de
rua. Porém, alguns praticavam pequenos furtos ou mendigavam.
O
estereótipo do cigano como trapaceiro — acentuado por séculos de boatos
sobre misticismo e obscurantismo — acabou se fortalecendo, assim como o
preconceito. Hoje, 65% deles estão desempregados, 80% são analfabetos e
quase todos vivem abaixo da linha de pobreza.
O líder da
comunidade, o Mukhtar Abed Alhakim Salim, garante que os furtos e a
mendigagem ficaram para trás. Ele afirma que só uma mulher cigana
continua a pedir dinheiro nas ruas de Jerusalém.
Ela se chama Amal
Nimer, tem 47 anos e 12 filhos, mas não tem carteira de identidade nem
direito a seguro-desemprego ou plano de saúde. Sua filha, Suhah, de 16
anos, ainda é analfabeta.
Para tentar ajudá-las, o Mukhtar apelou
para o prefeito de Jerusalém, Nir Barka. Mais de 50% das crianças não
frequentavam escolas em 2011.
Barkat concedeu bolsas de estudos a cem
jovens ciganos entre 2011 e 2012, além de financiar aulas de
alfabetização para adultos. Hoje, só 20% das crianças circulam pelas
ruas durante horário escolar.
— Não somos mais cantores e dançarinos, mas não gozamos da modernidade. A situação é grave — diz Abed Alhakim Salim.
Fonte: O Globo Online
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