Todos nós conhecemos a história do último dos Três Porquinhos, que frustrou o Lobo Mau ao construir sua casa com tijolos, em vez de usar palha ou galhos, como seus irmãos.
Mas poucos sabem que, mais adiante, o porquinho aprimorou a vigilância de sua casa instalando espelhos convexos de segurança em pontos estratégicos ao longo da estrada de acesso.
Bem, e por que não? Na edição atual da publicação "Animal Behaviour", pesquisadores apresentam evidências de que porcos domésticos podem aprender rapidamente o funcionamento de espelhos e usam seu entendimento de imagens refletidas para visualizar seus arredores e encontrar alimento.
Os pesquisadores ainda não podem afirmar se os animais percebem que os olhos no espelho são deles mesmos, ou se os porcos podem se equiparar aos macacos, golfinhos e outras espécies que passaram no famoso "teste de auto-reconhecimento do espelho" --considerado um sinalizador de autoconhecimento e inteligência avançada.
Ao que eu digo, grande coisa. Por que os porcos deveriam gastar um precioso tempo de espelho inspecionando seus dentes ou ajeitando os pelos do queixo, quando poderiam estar usando o espelho como ferramenta para encontrar uma vista muito mais bela, o paraíso dos porcos que vêm numa tigela?
O fato é apenas um de uma série de recentes descobertas do nascente estudo da cognição dos porcos. Outros pesquisadores descobriram que porcos são brilhantes em se lembrar onde estão escondidos os suprimentos de comida e o tamanho de cada pilha em relação ao restante.
Eles mostraram que o Porco A pode, quase instantaneamente, aprender a seguir o Porco B quando este mostra sinais de saber onde a boa comida está armazenada, e que o Porco B tentará enganar o porco que o segue e colocá-lo fora do rastro, para que o Porco B possa atacar sua comida em paz.
Aprendizado
Eles descobriram que os porcos estão entre os animais mais rápidos a aprender uma nova rotina. Eles conseguem realizar inúmeros truques: pular, saudar e ficar de pé, girar e fazer sons parecidos com palavras sob um comando, desenrolar tapetes, arrebanhar ovelhas, abrir e fechar jaulas, jogar videogame com controle remoto, e muito mais.
Para o bem ou para o mal, os porcos também são lentos para se esquecer. "Eles conseguem aprender algo na primeira tentativa, mas é difícil para eles desaprenderem", disse Suzanne Held, da Universidade de Bristol. "Eles podem ficar assustados uma vez e ter sérios problemas para superar aquilo".
Os pesquisadores também descobriram que não importam os novos detalhes encontrados sobre a perspicácia dos porcos, a reação pública é sempre a mesma.
"As pessoas dizem, 'Ah, sim, os porcos são mesmo espertos, não é?'", disse Richard W. Byrne, professor de psicologia evolucionista da Universidade de St. Andrews.
"Eu recomendaria que alguém estudasse ovelhas e bodes em vez de porcos, de forma que as pessoas ficassem adequadamente impressionadas em descobrir que seu animal é inteligente".
Com sua frustração artificial colocada de lado, ele acrescentou, "se você quer compreender a evolução da inteligência e dos comportamentos sociais, é importante trabalhar com animais como porcos, sem nenhum parentesco conosco", mas primos das baleias e dos hipopótamos.
Tão longe, e ao mesmo tempo tão perto. Na semana passada, uma equipe internacional de biólogos divulgou o primeiro rascunho da sequência do genoma do porco, o conjunto completo de instruções genéticas para fazer a raça Duroc da espécie Sus scrofus.
Mesmo num olhar apressado, "o genoma do porco se compara favoravelmente ao genoma humano", disse Lawrence Schook, da Universidade de Illinois, em Urbana-Champaign, um dos líderes da equipe.
"Partes muito grandes são mantidas em pedaços completos", afirmou ele, praticamente sem alterações nos mais de 100 milhões de anos desde que os ancestrais dos humanos e dos porcos se dividiram.
Schook está particularmente ansioso para ver se os muitos paralelos fisiológicos e comportamentais entre humanos e porcos são refletidos em nossos respectivos genomas.
Corações de porcos são como nossos corações, segundo ele, porcos metabolizam medicamentos como nós, seus dentes lembram os nossos, e seus hábitos podem fazer o mesmo.
"Olho os porcos como um grande modelo animal representativo de doenças do estilo de vida humano", disse ele. "Porcos gostam de ficar sem fazer nada, gostam de beber, e, se tivessem a chance, eles fumariam e veriam televisão".
Domesticação
Os porcos têm vivido em currais há pelo menos oito mil anos, quando foram domesticados na Ásia e na Europa. A domesticação foi simples, pois eles gostavam muito de procurar comida em locais de lixo.
"Os porcos eram difíceis de caçar, mas, se você colocasse o lixo para fora, bandos deles seriam atraídos, vindos da floresta", disse Schook.
"Depois de um tempo, as pessoas perceberam que não precisavam caçá-los. Tudo que precisavam fazer era colocar uma cerca ao redor do lixo".
Os porcos eram incansáveis máquinas de compostagem. "Eles se alimentavam de nosso lixo", disse Dr. Byrne. "Tudo que produzíamos, eles transformavam numa ótima carne".
A carne de porco está entre as carnes mais populares do mundo; em muitos lugares, os porcos são uma valiosa forma de moeda. "Em partes da Nova Guiné, eles são tão importantes para as vilas que chegam a ser amamentados por mulheres", contou ele.
É claro, os porcos nem sempre são tratados com tanto carinho, e os pesquisadores denunciaram fazendas de criação. "Sou alemão e adoro linguiça, mas nunca comeria carne de porco que não fosse de criação livre", disse Held.
Mesmo na domesticidade, os porcos mantiveram muito de sua esperteza. Byrne atribui a inteligência dos porcos às mesmas pressões evolucionárias que estimularam a esperteza dos primatas: a vida social e o alimento.
Porcos selvagens vivem em grupos sociais de longo prazo, acompanhando uns aos outros como indivíduos, buscando melhor proteção contra predadores.
Eles também realizam buscas por difíceis fontes de alimento, exigindo uma destreza no focinho não muito diferente da habilidade de um macaco.
Como já se havia visto macacos usando espelhos para localizar comida, Donald M. Broom, da Universidade de Cambridge, e colegas decidiram buscar um tipo similar do chamado reconhecimento de avaliação, em porcos.
Eles começaram expondo sete porcos, com idades entre 4 e 8 semanas, a cotas de quatro horas com um espelho e gravaram suas reações.
Os porcos ficaram fascinados, apontando seus focinhos para o espelho, hesitando, vocalizando, se aproximando, caminhando para frente e cheirando a superfície, olhando sua imagem de diferentes ângulos, olhando atrás do espelho.
Quando o espelho foi colocado em seu cercado um dia depois, os porcos, já experientes com vidros, o saudaram com entusiasmo.
Em seguida, os pesquisadores colocaram o espelho na área delimitada, junto a uma tigela de comida que não podia ser diretamente vista, mas cuja imagem estava refletida no espelho.
Eles então compararam as reações dos porcos que tinham experiência com o espelho com aqueles sem experiência. Ao mirar a comida virtual no espelho, os porcos experientes se viraram e, numa média de 23 segundos, já haviam encontrado a comida.
Os porcos sem experiência, entretanto, tomaram o reflexo como realidade e buscaram, em vão, encontrar a tigela atrás do espelho.
Não há dúvidas de que os pobres porquinhos frustrados mal podiam esperar para chegar em casa, abrir uma cerveja e ligar a TV.
Fonte: Folha Online
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