O mistério que acompanha a vida dos moradores de uma pequena cidade francesa há quase 60 anos pode ter sido enfim desvendado.
Em 1951, o vilarejo de Pont-Saint-Esprit, no sul da França, foi assolado por um surto de loucura que, em 10 dias, provocou alucinações, manias de perseguição e ataques de violência em mais de 300 pessoas, numa cidade que na época não contava com mais do que 4,5 mil habitantes.
Sete moradores acabaram morrendo e 50 tiveram de ser internados em clínicas psiquiátricas, alguns por mais de um ano depois do surto coletivo, que logo passou a ser chamado como o "caso do pão maldito".
Nunca se chegou com exatidão às verdadeiras causas do surto, mas agora um escritor dos Estados Unidos jura ter encontrado as respostas para o enigma: seria o serviço secreto americano, a CIA, quem estaria por trás da história.
Hank Albarelli Jr. vai além e afirma com convicção que o responsável pela intoxicação não fora nem fungo ou tampouco veneno, mas sim LSD, droga alucinógena que tinha recém sido descoberta.
Na época, diz Albarelli Jr, o LSD era o mais novo alvo de experimentos científicos nas pesquisas sobre controle da mente humana, num período em que a Guerra Fria se fortalecia cada vez mais entre russos e americanos, comunistas e capitalistas.
A teoria conspiratória, digna de um episódio de série policial americano, foi publicada nos Estados Unidos no livro A Terrible Mistake (Um terrível engano, em tradução literal).
Armado com dezenas de documentos oficiais da CIA, do Exército americano e da Casa Branca, o escritor agora quer convencer pessoalmente os moradores da cidade de que o polêmico "caso do pão maldito" foi provocado por seus compatriotas, e não acidentalmente pelo padeiro mais famoso de Pont-Saint-Esprit.
A tarefa não vai ser fácil. Até hoje, os moradores estão convencidos de que duas fornadas inteiras da padaria Briand, a principal e mais apreciada do vilarejo, tinham sido fabricadas com uma farinha contaminada por um fungo conhecido desde a Idade Média, o esporão do centeio.
O fungo se forma nas sementes do centeio e, se consumido, provoca alucinações e mal-estar. Este fungo nada mais é do que a origem do próprio LSD, depois de sintetizado e adicionado a outras substâncias.
Testemunhas relatam alucinações
Fortalece essa versão o fato de que todas as vítimas haviam consumido o "pão maldito", inclusive crianças.
As histórias decorrentes da intoxicação, registradas nos jornais da época e na memória dos que viveram o episódio, são amedrontadoras: uma dizia que o diabo não parava de puxar a sua perna enquanto ela tentava dormir, outro disse que estava com a barriga infestada por cobras.
Um outro doente saltou de uma janela pensando ser um avião, enquanto que um menino de 8 anos pensava que estava sendo perseguido por fogo.
"Foi uma catástrofe! Quem não tinha consumido o pão maldito, como eu, nunca vai esquecer das cenas que viu.
Pessoas que sempre foram normais saíram às ruas gritando verdadeiros absurdos", conta Paul Pagès, 84 anos, diante da oficina mecânica onde ainda trabalha.
"Perdi um grande amigo de infância, que consumia diariamente o pão da padaria Briand e, naquele triste dia, pelo visto ainda estava com bastante fome."
Já o veterano de guerra Joseph Lopes, 93 anos - e com 34 quando aconteceu o caso -, chegou a provar o tal pão, mas apenas um pequeno pedaço.
Saiu ileso, apenas sentiu enjoo, curado com uma noite de sono - até que acordou no meio da madrugada com o pai cantando ópera no quarto ao lado.
"Ele dizia que estava comandando uma orquestra com 30 músicos. Apontava para eles, ria, e continuava a cantar, certo de que estava se apresentando no teatro", relata Lopes.
"Algumas pessoas chegaram a tomar litros de leite pensando que tinham sido envenenadas. Foi o caso da minha mãe, que comeu o pão mas conteve os sintomas desta forma."
O problema é que, ao contrário do que se especulou, os efeitos do fungo sozinho não teriam provocado efeitos tão duradouros e nem tão devastadores como a morte, alertaram cientistas na época.
As dúvidas eram tantas sobre a origem do surto que, depois de 12 anos de processo judicial contra o padeiro, nenhuma indenização foi acordada a qualquer família de vítima.
O mistério permaneceu em aberto e ao longo dos anos os habitantes não tiveram outra alternativa senão esquecê-lo.
Ao invés de uma solução para o caso, a nova versão dos fatos - através do livro de Albarelli Jr. - vem confundir ainda mais a cabeça das poucas testemunhas que restaram.
"Acho que os moradores podem até se interessar em ouvir essa história de CIA, mas a essa altura, ninguém vai mudar de ideia.
Ainda mais se tratando de uma história tão extraordinária", avalia o vice-prefeito Jean-Pierre Colombet, que tinha 10 anos quando aconteceu o episódio.
Fonte: Terra
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