segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Ataques de tubarões crescem e o maior culpado é o uso não sustentável dos mares. Peixe está ameaçado por pesca predatória


Terror dos surfistas, vilão de Hollywood, fera implacável dos mares, serial killer de barbatanas. Há milênios os tubarões despertam medo e fazem vítimas mundo afora.

Somente no ano passado, foram 79 ataques, o maior número da década. Em apenas um dia de dezembro, no Egito, quatro banhistas foram atacados - dois perderam os braços; e outro, a mão.

Cenas como esta explicam por que a popularidade do animal anda tão em baixa. Mas não esclarece o que tem deixado esses peixões tão inquietos. Os biólogos, no entanto, já chegaram a consenso: somos nós.

Na verdade, dizem, eles são as maiores vítimas, em razão do aumento do número de pessoas na água, da destruição do ecossistema marítimo e da pesca descontrolada.

Para se ter uma ideia, a média anual de pessoas mortas por peixes é inferior a cinco. Virou piada, mas é verdade: é mais fácil alguém morrer atingido por um coco do que atacado por um tubarão.

Enquanto isso, mais de 70 milhões deles são abatidos todos os anos, em boa parte devido à demanda pela barbatana. Cerca de 120 países participam dessa pesca predatória, entre eles, o Brasil.

- O número de ataques causados por tubarões aumentará a cada década - assegura George Burgess, diretor do Arquivo Internacional de Ataques de Tubarões, vinculado à Universidade da Flórida. - Eles causam poucas mortes e, francamente, elas não são nossa maior preocupação. Concentramos esforços em modos de administrar a pesca e garantir que nossos filhos e netos possam ver essas espécies no mar.

Não é uma missão tão simples quanto parece. Na Costa Leste americana, onde está Burgess, alguns tipos de tubarões tiveram sua população reduzida em 90%.

Em todo o mundo, o tubarão branco perdeu 80% de seus indivíduos em apenas duas décadas. Se ainda não houve espécies extintas, é porque se trata de um animal oportunista, que sempre troca de área.

Mesmo ágil e daquele tamanho, o tubarão é vulnerável às mesmas pressões das espécies muito menores com quem divide os oceanos. Afinal, trata-se de um animal que ocupa o topo da cadeia alimentar.

Se a temperatura do planeta continuar subindo, por exemplo, os recifes de corais serão embranquecidos, o que sacrificará o número de peixes, e diminuirá a alimentação disponível para os tubarões, comprometendo a existência também dessas populações.

E, ao contrário do que ocorre com o urso panda, o mico-leão dourado e que tais, quando se trata de tubarões, os ambientalistas não contam com o apoio popular.

Para a maioria da opinião pública, esses peixões de 8 mil dentes devem ser relegados aos livros de História e à panela.

- Nossas culturas são diferentes, as linguagens também, mas a reação provocada pelos tubarões são a mesma - analisa. - Ficamos preocupados com algo que não conseguimos ver ou controlar.

Não nos sentimos muito à vontade na água, não é o local onde somos melhores. Por isso temos medo.

Nos últimos 20 anos, tivemos algum sucesso com a mídia. Mas mudar a cabeça das pessoas, mostrar como o tubarão é parte daquele ecossistema, é uma luta diária. E basta um ataque para voltarmos à estaca zero.


Em Pernambuco, o retrato da destruição de um habitat


Embora os últimos três anos tenham assistido a uma ascendente no índice global de ataques de tubarões - foram 53 em 2008, 63 em 2009 e 79 no ano passado -, alguns especialistas consideram cedo demais para concluir que os mares vão se tornar cada vez mais hostis ao homem.

- Vendo apenas três anos não dá para dizer que há uma tendência de aumento. É preciso considerar por que, onde e com que frequência os tubarões estão atacando pessoas - avalia Bryan Wallace, diretor de Ciência do Programa de Espécies Marinhas da Conservação Internacional e professor da Universidade Duke, nos EUA. - Alguns deles, de áreas frequentemente visitadas por mergulhadores, respondem aos motores de barco aproximando-se deles, não fugindo.

Há, também, especulação de que as práticas de pesca diminuem as presas naturais consumidas por tubarões.

Para Fábio Hazim, diretor do Departamento de Pesca e Aquicultura da Universidade Federal Rural de Pernambuco, trata-se de um “oscilação natural” dos índices.

O principal fator, ele concorda, é o aumento da presença humana no litoral. Em seu estado, porém, outros motivos deve ser considerados.

A costa da Região Metropolitana de Recife é uma zona de caça popular entre tubarões, principalmente o tigre e o cabeça-chata.

Eles buscam alimento onde as ondas arrebentam - área também benquista pelos surfistas. O fato de a água ser turva facilita ainda mais uma tragédia.

Não à toa, Pernambuco responde por 51% (45) das agressões promovidas pelos tubarões no Brasil entre 1931 e o ano passado (88).

- Temos conseguido diminuir a incidência de ataques capturando-os e transportando-os para o alto mar - conta Hazim. - Marcamos os animais, para que possamos conhecer suas rotas, e depois eles são soltos longe da praia.

O que poucos imaginam é que os ataques evitados pela trupe de Hazim, na maioria das vezes, não são intencionais.

Segundo Marcelo Szpilman, biólogo marinho e diretor do Instituto Aqualung, o tubarão-tigre “confunde o surfista com uma tartaruga”.

- Visto por baixo, o surfista é só uma prancha, uma superfície lisa, com duas pernas - lembra. - Eventualmente, por um erro de identificação, o tubarão dá a mordida investigatória, percebe que seu alvo não é o que ele imaginava e solta a vítima.

Quase todos os acidentes ocorrem com uma única mordida em uma extremidade. Ou, então, para marcar território, principalmente se a autora do ataque é uma fêmea grávida.

Szpilman lembra que a região de Suape, ao Sul de Recife, era um mangue - região rica em biodiversidade e fornecedora de alimento -, que, no início dos anos 90, foi aterrado e perdeu duas bocas de rio, obra necessária para a construção de um porto.

Era neste local que as fêmeas subiam o rio para dar à luz seus filhotes. Os tubarões que batiam ponto ali se deslocaram para a Grande Recife. E, assim, houve aumento da interação dos homens com estes animais.

Ainda de acordo com o biólogo, hoje os estudos de impacto ambiental jamais autorizariam um empreendimento com aquele porte.

- Aquela foi uma circunstância excepcional - opina. - Não se permitiria mais aquela intervenção agora, quando a consciência ecológica é mais forte.


Fonte: Extra Online

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