Trata-se de uma placa de mármore que, ao que tudo indica, terá sido uma lápide funerária e que data, no mínimo, do fim do século IV da nossa era.
Quem terá sido Yehiel? Talvez um escravo judeu que viveu - e morreu - há
mais de 1600 anos numa suntuosa vila romana (uma casa senhorial) perto
de Silves, no Algarve?
Talvez nunca venha a saber-se. Mas o que parece
estar garantido é que a descoberta agora anunciada por arqueólogos
alemães, realizada em colaboração com arqueólogos portugueses,
representa o mais antigo vestígio cultural judaico jamais encontrado na
Península Ibérica.
A equipe de Dennis Graen, da Universidade
Friedrich Schiller de Jena, na Alemanha, anda há três anos a escavar as
ruínas de uma vila romana descoberta em 2005 por Jorge Correia no sítio
das Cortes, próximo de São Bartolomeu de Messines e da Estrada Nacional
124.
Na altura, este arqueólogo da Câmara Municipal de Silves encontrara
cerâmicas e mosaicos romanos à superfície.
O concelho de Silves
é rico em vestígios históricos. A descoberta foi há quase um ano, mas
só agora viu confirmada a sua importância. "Isto é uma paixão", diz-nos o
arqueólogo português, que, embora não tenha feito parte da equipe que
procedeu à escavação, acompanhou de perto os trabalhos. "Conheço bem o
terreno, e estava aqui todos os dias."
À vista encontram-se as
estruturas da vila romana, com mais de cem metros quadrados, que teriam
sido destinadas ao curral e outras instalações de apoio aos animais.
A
parte principal da vila continua por descobrir e, em Setembro, as
escavações vão ser retomadas. Mas enquanto o proprietário do terreno
onde decorreram até aqui as escavações não levantou qualquer obstáculo, o
vizinho das terras ao lado não as autorizou, conta Jorge Correia.
Contatado
pelo PÚBLICO, Graen explica de onde veio o interesse da equipe alemã
por aquele local: "Em 2008, estávamos à procura de um sítio interessante
para começar um projeto."
O objetivo inicial era estudar o modo de
vida dos habitantes do interior da província romana da Lusitânia.
Enquanto a costa portuguesa já tinha sido bastante explorada, o mesmo
não acontecera no interior algarvio.
Para a presidente da Câmara
de Silves, Isabel Soares, a universidade alemã pode contribuir para
despertar ainda mais o valor histórico do município, pois a comunidade
local "não dá muitas vezes valor ao patrimônio".
A importância de Silves
na época do domínio árabe faz com que, a cada passo, se encontrem
sinais históricos a lembrar esse passado. A propósito do novo achado na
vila romana, diz Isabel Soares: "A comunidade judaica não deixará
certamente de se identificar com este local."
O contato entre
especialistas alemães e portugueses "foi estabelecido por Pedro Barros,
responsável pela Extensão do Algarve do Igespar" (Instituto de Gestão do
Patrimônio Arquitetônico e Arqueológico), salienta Graen. "Após termos
localizado com técnicas de prospecção geofísica a posição das
estruturas soterradas, começamos a escavar em 2009."
Mas naquela
altura os cientistas não estavam de todo à procura de sinais da cultura
judaica. "Na realidade", diz Henning Wabersich, um dos elementos da
equipa de escavação, em comunicado da universidade, "estávamos à espera
de encontrar alguma inscrição em latim, quando demos com a lápide." Os
cientistas demorariam algum tempo a determinar em que língua estava
inscrita.
A placa, de mármore, mede 40 centímetros por 60 e nela
lê-se o nome "Yehiel" (um nome mencionado na Bíblia), seguido de uma
série de letras cuja decifração ainda está em curso.
Hastes de veado
descobertas junto da lápide, que foram entretanto datadas por
radiocarbono, remontam ao ano 390 da era cristã, o que sugere que a
lápide não pode ser posterior a essa data.
Bênção do céu
Até aqui, o vestígio arqueológico mais antigo deixado por judeus no
atual território de Portugal era uma lápide funerária com uma inscrição
em latim e uma gravura de uma menorá (candelabro de sete braços) datada
de quase cem anos mais tarde: 482 d.C.
"Essa lápide foi encontrada na basílica paleocristã de Mértola, no Sudeste do Alentejo", diz-nos ainda Graen. Há também duas inscrições em hebraico que, salienta o investigador, "datam provavelmente dos séculos VII ou VIII e foram descobertas em Espiche (Lagos) no século XIX".
O novo achado tem uma outra particularidade absolutamente inédita, para além da sua idade, como frisa Graen: "Em todo o Império Romano, nunca foi encontrado até aqui qualquer outro vestígio hebraico/judaico numa vila romana."
Perguntamos-lhe: poderá Yehiel ter sido um escravo a viver na casa de Cortes naquela altura? "Sim, seria uma possibilidade", responde. "Mas talvez o dono da casa fosse judeu - ou, mais provavelmente, talvez tenha havido um cemitério na proximidade da casa e a lápide veio dali."
Por que é que ainda não foi possível decifrar toda a inscrição? "A má qualidade dificulta a decifração", diz Graen. "Mas fui contatado ainda hoje [ontem] por mais um perito que me garante que consegue ler "O judeu recebeu a bênção do céu"."
Porém, Graen frisa que a inscrição não estará em hebraico: "Foi provavelmente escrita em aramaico ou noutra língua semita."
Mas de uma coisa ele não tem dúvidas: "É a lápide do túmulo de um homem da Judeia e, portanto, é o mais antigo vestígio deixado por um judeu na Península Ibérica."
Fonte: Público
"Essa lápide foi encontrada na basílica paleocristã de Mértola, no Sudeste do Alentejo", diz-nos ainda Graen. Há também duas inscrições em hebraico que, salienta o investigador, "datam provavelmente dos séculos VII ou VIII e foram descobertas em Espiche (Lagos) no século XIX".
O novo achado tem uma outra particularidade absolutamente inédita, para além da sua idade, como frisa Graen: "Em todo o Império Romano, nunca foi encontrado até aqui qualquer outro vestígio hebraico/judaico numa vila romana."
Perguntamos-lhe: poderá Yehiel ter sido um escravo a viver na casa de Cortes naquela altura? "Sim, seria uma possibilidade", responde. "Mas talvez o dono da casa fosse judeu - ou, mais provavelmente, talvez tenha havido um cemitério na proximidade da casa e a lápide veio dali."
Por que é que ainda não foi possível decifrar toda a inscrição? "A má qualidade dificulta a decifração", diz Graen. "Mas fui contatado ainda hoje [ontem] por mais um perito que me garante que consegue ler "O judeu recebeu a bênção do céu"."
Porém, Graen frisa que a inscrição não estará em hebraico: "Foi provavelmente escrita em aramaico ou noutra língua semita."
Mas de uma coisa ele não tem dúvidas: "É a lápide do túmulo de um homem da Judeia e, portanto, é o mais antigo vestígio deixado por um judeu na Península Ibérica."
Fonte: Público
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