Pantera-negra, forma "morena" do leopardo, fotografada na África
Um dos felinos mais bonitos da Terra acaba de ficar um pouco menos
misterioso. Dois cientistas brasileiros, trabalhando com colegas dos EUA
e da Rússia, identificaram a mutação que transforma leopardos "comuns"
na célebre pantera-negra.
De quebra, os pesquisadores também flagraram a alteração genética
responsável por produzir a versão negra de outro felino selvagem, o
gato-dourado-asiático.
A descoberta está descrita na revista científica "PLoS ONE". Os autores
brasileiros do estudo são Alexsandra Schneider e Eduardo Eizirik, ambos
da PUC-RS (Eizirik também é ligado ao Instituto Pró-Carnívoros, em
Atibaia, interior paulista).
O biólogo da PUC gaúcha conhece como poucos a genética da pelagem dos
felinos. Há quase dez anos, ele foi coautor do trabalho que identificou
pela primeira vez as mutações que produzem versões pretas do gato
doméstico, da onça-pintada e do jaguarundi (espécie que lembra uma
versão miniatura da suçuarana, com a qual tem parentesco próximo).
Mas ainda havia (e há) um bocado de trabalho a fazer nessa área, já que
as chamadas formas melânicas (ou seja, de pelagem preta) estão
registradas para 13 espécies de felinos, sem falar em relatos não
documentados sobre tigres negros, por exemplo.
"No caso dos tigres, as fotos que eu vi até hoje não mostram melanismo
verdadeiro", contou Eizirik à Folha. "Está mais para variação na largura
das listras."
Grosso modo, há dois jeitos principais de criar um felino negro, ambos
envolvendo um receptor, ou fechadura química, conhecida como MC1R.
É
nessa fechadura que se encaixam as moléculas de um hormônio que estimula
a produção da eumelanina, o pigmento da cor escura.
Por um lado, se o MC1R ficar hiperativo durante o desenvolvimento do
animal, ele pode nascer melânico.
Por outro, o receptor pode ser
bloqueado por outra molécula, conhecida como ASIP, cuja ação leva à
produção de um pigmento de cor clara. Se a ASIP for eliminada, portanto,
o bicho também pode acabar ficando escuro.
Ora, o que o novo estudo mostrou, estudando 11 panteras-negras
asiáticas, é que o DNA dos gatões tinha uma alteração de uma única
"letra" química no gene que contém a receita para a produção da ASIP.
Essa letrinha trocada é suficiente para atrapalhar a fabricação da
proteína e inutilizá-la.
Resultado: leopardos de pelos pretos -mas só se os bichos carregarem
duas cópias do gene alterado. Coisa semelhante, embora não idêntica,
ocorre no caso do gato-dourado-asiático.
A questão agora é entender o papel evolutivo da mutação. Eizirik conta que, nas matas da península Malaia (que pega trechos de países como Malásia e Tailândia), as panteras-negras chegam a ser quase 100% da população de leopardos, enquanto são raras na África.
"Pode ser um resultado casual do isolamento dessa população, ou pode ser
resultado da seleção natural", diz. Há quem acredite que a cor preta
seja mais vantajosa em matas mais fechadas, mas isso ainda não foi
confirmado.
Fonte: Folha de São Paulo
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