As bactérias causadoras de chuva que vivem em nuvens podem ter desenvolvido a capacidade de estimular temporais como forma de se dispersar por todo o mundo, constatou um recente estudo.
A nova pesquisa oferece aos cientistas um primeiro vislumbre sobre a conexão entre biologia e clima e sobre a maneira pela qual os minúsculos organismos conseguem acompanhar o ciclo meteorológico para percorrer o mundo.
Os micróbios, conhecidos como nucleadores de gelo, são encontrados na chuva, na neve e no granizo em todo o mundo, de acordo com trabalhos anteriores liderados por Brent Christner, microbiólogo da Universidade Estadual da Louisiana.
Christner demonstrou que, se a concentração for forte o suficiente, esses organismos podem operar de maneira eficiente como propulsores para a formação de gelo nas nuvens.
Isso representa o primeiro passo na formação da neve e da maioria das formas de chuva. Mas ele ainda não havia conseguido identificar sua fonte - ao menos até agora.
No seu mais recente estudo, Christner e os membros de sua equipe descobriram que as criaturas têm por origem a neve, terra e plantas jovens em locais tão dispersos quanto a Antártida, o Território do Yukon, no Canadá (perto do Polo Norte) e os Alpes franceses.
As bactérias podem fazer parte de um sistema constante de retroalimentação entre esses ecossistemas e as nuvens.
"A descoberta está afetando profundamente o mundo da ciência atmosférica", afirma Christner. "A ideia que desenvolvemos teria sido vista como completa loucura 25 anos atrás, mas as novas descobertas revigoraram as pesquisas... quanto ao papel que a biologia talvez represente para os processos atmosféricos".
Colonizadores
No solo, os pesquisadores descobriram os nucleadores de gelo em companhia de aerossóis - pequenas partículas suspensas no ar.
A composição química de ambos os elementos podia ser traçada de maneira a comprovar sua conexão com as nuvens. Em alguns locais, os nucleadores surgem principalmente da terra e dos ecossistemas vegetais, de acordo com os resultados da pesquisa.
Uma possível explicação seria que as bactérias dependem da atmosfera - e da chuva - para promover sua dispersão, da mesma maneira que as plantas dependem dos grãos de pólen dispersos pelo vento a fim de colonizar novos ambientes, diz Christner.
Por exemplo, um organismo especializado em viver em plantas pode subir ao ar, estimular a formação de gelo nas nuvens e viajar de volta à superfície acompanhando as precipitações geradas por essas nuvens.
Isso pode ser um componente importante mas ainda não reconhecido do ciclo normal de vida de uma bactéria, de acordo com Christner, que publicou os resultados de sua pesquisa em novembro, na revista Proceedings of the National Academy of Science.
Pegando carona
A teoria - conhecida como bioprecipitação - foi proposta inicialmente por David Sands, um patologista vegetal da Universidade Estadual de Montana, nos anos 80.
Mas existia pouca informação sobre a maneira pela qual as bactérias causadoras de chuva se movimentavam pela atmosfera, até que Christner e seus colegas começassem seu trabalho, em 2005.
Sands disse que as criaturas podem até mesmo empregar meios criativos de transporte. Elas poderiam, ele sugere, "pegar carona" com o pólen ou com insetos.
"Nós pensávamos inicialmente que (as bactérias) fossem apenas patógenos (germes) de plantas, mas as localizamos em lagos de montanha, em quedas d'água e na Antártida - elas aparentemente se movimentam muito", afirmou.
Os cientistas ainda não identificaram a maioria dos nucleadores de gelo importantes presentes na atmosfera. Por exemplo, toda uma gama de outros micróbios - bem como grãos de pólen, fungos e outros organismos - pode ser responsável pela criação dos nucleares de gelo identificados, aponta Christner.
A vasta maioria dos nucleares de gelo que estão ativos a temperaturas superiores a 10 graus científicos foram identificados como biológicos ou bacterianos.
Roy Rasmussen, cientista sênior no Centro Nacional de Pesquisa Atmosférica dos Estados Unidos, em Boulder, Colorado, estuda o ciclo de água da Terra nos períodos de inverno.
A teoria de que bactérias possam determinar o ciclo de água "é uma hipótese interessante, mas ainda não foi verificada", afirmou Rasmussen em mensagem de e-mail.
"A verdadeira questão é determinar se a concentração dessas células é forte o bastante para influenciar a formação de precipitação de qualquer maneira significativa", ele acrescentou.
Dança da chuva
Os cientistas já suspeitavam que as bactérias das nuvens pudessem estar ligadas às plantas e ao solo em um "circuito de retroalimentação", um sistema de troca entre ecossistemas.
De fato, essas bactérias podem ter evoluído com as plantas, ao longo de milênios, e construído uma relação de dependência, diz Sands.
O conceito também se enquadra ao estudo que Sands está conduzindo sobre a ideia de que ciclos de seca se conectam às bactérias nas nuvens.
Por exemplo, se as pessoas utilizam excessivamente a terra, "as bactérias ficam sem lar... e isso pode ter sérias consequências, entre as quais possivelmente a falta de chuva", ele afirma.
Em termos simples, falta de vegetação pode gerar falta de bactérias, o que por sua vez limitaria a capacidade de formação de chuva das nuvens.
Mas os agricultores sujeitos a secas têm alternativas, disse Sands. Poderiam optar por espécies de plantas que abriguem mais bactérias. "Melhor do que fazer a dança da chuva", ele acrescentou.
Sands e seus colegas criaram uma rede de pesquisadores que já estão observando bactérias em terras agrícolas da Síria, Uzbequistão e Nova Zelândia.
Mas ele afirma que "chegamos apenas à metade do caminho. Ainda não provamos todas essas coisas".
Fonte: Terra
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