Eu suspeitava há muito tempo que os peixes fossem mais inteligentes do que em geral supomos. Quando criança, eu tinha um aquário no qual criava diversos peixinhos dourados.
Eles certamente sabiam que era hora de comer quando viam minha mão por sobre o aquário, e esperavam com entusiasmo a sua deliciosa ração para peixes.
Também costumavam exibir comportamentos mais sombrios e perturbadores. Ficava evidente que uma vida segura e com abundância de alimento não trazia uma sensação de realização, para eles.
De vez em quando, o puro tédio de suas vidas ou talvez os longos e escuros invernos da cidade de Toledo levavam um dos peixes a pôr fim ao seu sofrimento, com um salto mortal que o conduzia ao assoalho do meu quarto.
Talvez eu esteja exagerando um pouco em minha projeção antropomórfica. Mas seria interessante descobrir qual é o nível real de inteligência dos peixes. Será que eles são capazes de aprender?
Um aquário de 35 litros no fundo do qual repousa um navio pirata feito de plástico, como decoração, decerto não é o mais estimulante habitat.
Mas no mundo colorido, diversificado e perigoso dos recifes de coral, os peixes precisam ser capazes de reconhecer não apenas os alimentos mas também quem são seus amigos e inimigos, seus parceiros de acasalamento e seus rivais, e de agir da maneira mais adequada diante de tudo isso.
Em um ambiente complexo e dinâmico como o dos recifes de coral, a flexibilidade e a capacidade de aprender seriam qualificações muito aproveitáveis.
Diversos estudos revelaram recentemente que os peixes que vivem em recifes de coral são animais surpreendentemente adaptáveis.
Peixes selvagens recentemente capturados logo aprendem novas tarefas, e são capazes de descobrir como discriminar entre diferentes cores, formas e padrões, mesmo que nunca os tenham encontrado previamente.
Os estudos sugerem que o aprendizado e a interpretação de novos estímulos podem ter papel importante nas vidas dos peixes que habitam os recifes de coral.
Para testar a capacidade dos peixes para aprender a distinguir entre formas, uma equipe de pesquisa liderada por Ulrike Siebeck, da Universidade de Queensland, Austrália, treinou peixes-borboleta para que se alimentem de um tubo ao qual diversas formas de estímulo visual são anexadas.
Entre os estímulos há um disco de látex tridimensional, um disco azul bidimensional pintado sobre uma chapa plástica, círculos pretos ou formatos helicoidais em chapas brancas.
Os peixes eram recompensados com comida quando tocavam repetidamente o estímulo - e não o tubo de alimentação- com seus focinhos ou bocas.
Os peixes não demoraram a aprender essa tarefa. Os pesquisadores então começaram a apresentar aos animais um dos estímulos originais acompanhado por um padrão alternativo, com o objetivo de distrai-los - objetos retangulares em lugar de circulares, círculos em lugar de hélices; os peixes tinham de tocar a forma que haviam sido condicionados a ativar inicialmente, para continuar a receber sua recompensa.
No primeiro teste, o índice de acerto que eles obtiveram foi da ordem de 70%; mas, em repetições posteriores dos testes, eles conseguiram elevar esse resultado a 80% e, posteriormente, a até 90%.
Os peixes, notavelmente, também aprenderam a distinguir quando a recompensa alimentar era postergada e entregue a distância maior do ponto de estímulo.
O peixe-borboleta exibia sinais do chamado comportamento antecipatório, ou seja, os animais testados tocavam o estímulo e depois nadavam velozmente para o ponto oposto do tanque, à espera da recompensa.
A resposta é semelhante à dos cães de Pavlov que aprenderam a antecipar alimentos por associação com o som de uma sineta.
Em outro conjunto de experiências, Siebeck treinou peixes-borboleta usando diferentes estímulos coloridos. Ela selecionou as cores azul e amarelo porque oferecem forte contraste entre si e são encontradas em muitos dos peixes que habitam os recifes de coral.
Depois de os peixes aprenderem a tocar repetidamente em alvos de látex a fim de obter recompensa alimentar, eles passavam a enfrentar uma escolha entre o alvo do treinamento e um alvo de cor alternativa.
Os resultados dos peixes foram ainda melhores no que tange à seleção de cores, e eles tocaram o alvo correto em mais de 90% das tentativas.
Talvez surpreenda menos que os peixes tenham aprendido a distinguir cores. Afinal, eles vivem em um ambiente multicolorido.
Mas o motivo das cores brilhantes entre os peixes de recifes de coral é um desafio para os biólogos já há muito tempo. Parece evidente que os padrões coloridos brilhantes seriam sinais efetivos de comunicação nas águas rasas e bem iluminadas em torno dos recifes de coral.
Mas em um mundo altamente predatório como o dos recifes de coral, as cores brilhantes também podem tornar um peixe mais visível para os predadores. De que maneira as vantagens e desvantagens se comparam e compensam?
Ao que parece, alguns peixes de cores brilhantes "ganham a vida" fornecendo um serviço valioso a animais que de outra forma poderiam tomá-los por presas.
Eles os limpam. Os peixes limpadores representam uma parte importante das comunidades de um recife de coral, e estabelecem pequenos territórios como "estações de limpeza", visitadas por toda espécie de peixes "clientes" para remoção de parasitas.
Com a atenção que demonstram a cores, padrões e formas, e sua capacidade de aprender sobre novas formas, é difícil não imaginar quais seriam os limites para a capacidade de aprendizado dessas criaturas.
É claro que eles jamais serão capazes de aprender a ler, mas pode ser que sejam capazes de aprender a apreciar as ilustrações de um livro.
Fonte: Terra
Nenhum comentário:
Postar um comentário