sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Os animais deuses

Hórus


As religiões ancestrais visualizavam o universo como uma grande mãe. As grandes deusas representavam a Terra Mãe ou o princípio gerador da vida.

A capacidade de conceber uma nova vida humana, dar à luz, produzir leite e nutrir a vida. Sem ela a nova vida extinguir-se-ia.

Na Babilônia a grande deusa é Ishtar, a mãe de Tamuz. Astarte é adorada pelos hebreus, fenícios e cananeus, de acordo com a liturgia.

No Egito temos Isis. Na Frígia temos Cibele, posteriormente identificada com as deusas Rea, Gea, Deméter, e com suas equivalentes romanas, Tellus, Ceres e Maia.

O culto à Grande Deusa é muito anterior à escrita e encontramos pinturas rupestres que mostram bisões, cavalos, ursos, veados e dezenas de outros animais.

São centrais nos rituais de caça expressando agradecimento aos animais sagrados que constituem poderosa fonte de vida, a própria energia vital de quem o ingere.

Nesse estágio eram freqüentes também representações da Grande Deusa como Senhora dos animais (com seus animais sagrados), como Deusa mãe coruja, ou como Madona com seu filho ao colo.

Acreditava-se que a mulher engravidava do sangue da menstruação. Por isto sempre se ofereciam sacrifícios de sangue à mãe Terra para pedir abundância de alimentos. Até que milhões de anos depois se trocou o sacrifício de sangue pelo auto sacrifício (a culpa).

Na Grécia arcaica, a imagem da Grande Mãe animal alimentava o pequeno Zeus como cobra, porca ou vaca. Réia - Cibele, para os romanos, é representada assentada num trono e ladeada de animais.


O xamanismo



Xamanismo é um nome genérico de origem siberiana para designar as práticas dos curadores e feiticeiros das culturas arcaicas.

O xamanismo é um fenômeno cultural, social e espiritual. As mais antigas manifestações xamânicas datam da era paleolítica (os rituais de caça nas pinturas).

Ele sobrevive quase sem alterações na Ásia, Oceania, no Ártico (esquimós) e principalmente na África e nas Américas.

O animal sempre teve um papel crucial no xamanismo. No plano inicial arcaico o animal e o ser humano não se diferenciavam, eram como uma única entidade.

Isto pode ser constatado através de pinturas rupestres como as da caverna Très Frères, na França (25.000 aC.).

Nesse local pode-se ver um xamã vestido com a pele e a cabeça de um cervo, a cauda do animal passando-lhe entre as pernas.

As inúmeras representações da grande Deusa, Senhora dos animais e a lenda do primeiro xamã, vem selar essa comunhão entre o homem e o animal.

Os buriates e iacutes da Sibéria nos contam a lenda do surgimento do primeiro xamã, que teria sido gerado pela águia (símbolo da consciência) e por uma mulher (identificada à liberdade). Portanto, desde o início o xamã é um misto de divino, de humano e de animal.

O poder dos xamãs relaciona-se diretamente com seus totens , ou em outras palavras, seus aliados animais.

Para um xamã um homem não é melhor e nem mais consciente do que um animal. O xamã oferece ao espírito do animal respeito e devoção, enquanto o animal oferece orientação e assistência.

Os animais, assim como as pedras, para os xamãs tem espíritos poderosos, cada qual com seus próprios talentos, e tem a qualificação de ajudar as pessoas nas tarefas específicas.

Um dos principais dons oferecidos pelo poder dos animais ao xamã em suas tarefas é a proteção e tutela.

Eles costumam descobrir seus animais de poder permitindo que aflorem durante uma dança espontânea ou tendo uma visão do animal.

Para os xamãs, as crises do mundo de hoje não são surpresa. São o resultado do desequilíbrio causado pela falta de respeito, e este desequilíbrio em última análise acarreta a perda de poder para um xamã.

Os xamãs ensinam que à medida que uma pessoa for aprendendo a se comunicar com as pedras e os animais, deve ter em mente que o segredo do sucesso é o respeito. Para ter sucesso é preciso cooperar com o meio ambiente.


O panteão Egípcio


Bastet


Os egípcios adoravam os animais e várias figuras de divindades teriomórficas são encontradas nos templos egípcios.

As figuras significam que o poder pode se encarnar de diversas formas. As representações semi-humanas de deuses exprimem um pensamento que aceita o homem sem rejeitar o animal. Thot, deus da escrita, tem uma cabeça de íbis. Harsaphs, tem cabeça de carneiro.

Hátor, deusa das mulheres, dos céus e das árvores, tem uma cabeça de vaca. Montu, deus da guerra, e Hórus, deus dos céus, tem cabeça de falcão.

Sobek, trem cabeça de crocodilo e Seth tem cabeça de animal não identificado. Khnum tem cabeça de carneiro e Anúkis tem dois chifres de gazela.

A base do aprendizado do conhecimento de qualquer iniciação era o livro de Thot. Esse conhecimento está contido nas vinte e duas cartas do Tarô Egípcio.

Cada carta do tarô representa uma etapa do desenvolvimento. Na carta " a balança da consciência" há um coração sendo pesado em um dos pratos.

No Egito, o coração era a sede da consciência - ele é pesado pelos animais e pelos deuses. Aos pés da balança aparece um cão, o deus Anúbis e um crocodilo comilão, a quem cabe comer o coração se este estiver pesado.

A cabeça da deusa Maat está em segundo plano, representando a Justitia. O deus Horus, o falcão, vigia a pesagem da consciência.

Segundo as leis celestes nenhum ser humano pode subestimar qualquer animal e matá-lo ou torturá-lo impunemente.

A descoberta do " Livro dos Mortos" revela elementos que aproximam o ordenamento ético-jurídico do Antigo Egito da moral e do Direito.

Dele consta o juramento negativo que as pessoas deveriam fazer durante o julgamento final: " Não aumentei o sofrimento dessas pessoas, não coloquei a injustiça no lugar da justiça, nunca desequilibrei o travessão da balança, nunca pequei contra a natureza".

No Egito o gato era considerado um animal sagrado, que recebia após a morte curiosas homenagens.

Um templo foi erigido para a deusa - gata Batest. Ela era representada com o corpo de mulher e cabeça de gata, e sustentava em uma das mãos o instrumento musical das bailarinas e no outro a cabeça da leoa, o que significava que a qualquer tempo poderia se metamorfosear numa das três deusas leoas - Sekmet, Pekhet e Tefnut.

O templo de Bastet foi descrito pelo historiador grego Herodoto, que viajou para o Egito no ano 450 a.C. Este luxuoso templo situava-se na cidade de Bubasti, numa ilha cercada pelos canais do Nilo.


O panteão hindu


Ganesha


Na Índia os animais são considerados sagrados e o hinduísmo adota a idéia de um panenteísmo (Deus está em tudo), diferente de panteísmo (Deus é tudo).

O Código Védico, da Índia, fundamenta-se na unidade da vida. Para o hinduísmo a única diferença que existe entre os animais e o ser humano é o grau de evolução.

Os avatares, encarnações de deuses, apresentam-se em formas de animais. Vishnu, o preservador, aquele que toma muitas formas, manifestou-se no mundo numa série de dez encarnações, três em forma animal.

Matsya, o peixe salvou a humanidade e os sagrados textos vedas do dilúvio. Kurma, a tartaruga, ajudou a criar o mundo sustentando-o em suas costas. Varaharha, o javali, elevou a terra para fora d' água com suas presas.

A importância de Hanuman, o deus-macaco, aparece no texto sagrado Ramayana, onde deu grande assistência a Rama na vitória contra o demônio Ravana, rei da ilha de Sri Lanka, que seqüestrara sua noiva.

Ganesh, o deus-elefante, o removedor de obstáculos, é filho de Parvati, filha da montanha sagrada, o Himalaia, com o deus Shiva, o destruidor.

Segundo a lenda ele tem uma cabeça de elefante, porque seu pai não o reconheceu e o degolou. Ao perceber seu erro Shiva prometeu repor-lhe a cabeça tomando-a da primeira criatura que visse, que foi um elefante.

Shiva, costuma ser representando com uma serpente, a divindade feminina Durga, com um leão e Sarasvati com um pavão.

Ainda na Índia, constitui-se, no século VI a.C., juntamente com o budismo, a tradição jainista, fundada por Mahavira Vardhamana.

Os membros do movimento jainista, ao qual pertencia Gandhi, pautam sua vida na não violência, são vegetarianos e reverenciam a natureza ao extremo.

Em seu juramento renunciam à destruição de seres viventes sejam sutis ou grosseiros, andem ou estejam parados.

São vários os santuários do jainismo, onde animais injuriados podem ser tratados. No povoado de Deshnoke, no templo Karni Mata, os ratos passeiam livremente enquanto os devotos oram.

Os sacerdotes do templo e os ratos comem nas mesmas tigelas e bebem água no mesmo lugar. Os sacerdotes dizem que os ratos são mensageiros dos deuses e que os sacerdotes do templo, ao morrerem, alcançarão a libertação, nascendo como ratos. Os ratos, ao morrerem, renascerão como sacerdotes.


Deus é o espírito da Terra


Molinero, em seu livro " Terralogia, ecologia mágica" nos ensina que " "Não eram mais primitivos os que adoravam o sol do que os que acreditaram encontrá-lo em um ídolo de pedra ou de ouro.

Não eram mais errados os que buscaram a Deus zoolatricamente e adoraram a rã, por seu sentido de fecundação, a cobra que tem o veneno, a vida e consegue seu corpo em círculo, que é em si o mandala infinito do universo.

Não estão mais errados os que adoraram a pantera negra, o lobo ou o elefante branco, do que aqueles que o humanizaram reverenciando os avatares, os profetas e os santos.

Deus está em toda parte, em todas as formas, porque é o espírito da Terra e a única energia que nasce do nada na ausência do todo, sendo em si a vida".[1]


Bibliografia

Bowker, John. Para entender as religiões. São Paulo: Editora Ática, s/d.

Dias, Edna Cardozo, A tutela jurídica dos animais. Belo Horizonte: Mandamentos, 2000.

Dias, Edna Cardozo. O animal nas principais religiões do mundo. Belo Horizonte: Liga de Prevenção da Crueldade contra o Animal, 1996.

Eisler, Riane. O cálice e a espada- nossa história, nosso futuro. Rio de Janeiro: Imago, 1989.

Eliade, Micea. O sagrado e o profano. Lisboa: Livros do Brasil, s/d.

Jain, J.C. Jainismo. Vida e obra de Mahavira Vardhama. São Paulo: Palas Athena, 1982.

Mertz, Bernard. O tarô Egípcio, um caminho de iniciação. São Paulo: Pensamento, 1987.

Molinero (Yogakrishanda. Terralogia, ecologia mágica. São Paulo: Mandala, s/d.

O livro dos mortos. Barcelona, 1989.

Soffiati, Arthur. As religiões da crise ambiental da atualidade. Campos dos Goitacases. Datil. Inédito.

Nota

[1] MOLINERO, (Yogakrishnanda). Terralogia, ecologia mágica. Mandala - livreiros/editores importadores. Ltda. São Paulo, sem data, pg. 11.


Edna Cardozo Dias

Fonte: Pensata Animal


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