No interior do Mato Grosso do Sul, um grupo de ufologistas busca extraterrestres e teme 2012.
Não é bem à velocidade da luz, mas sacolejando a 40 por hora em uma estrada de chão batido que se chega à fazenda Boa Sorte, em Corguinho, interior do Mato Grosso do Sul.
O município de 4.370 habitantes, a 96 km da capital, Campo Grande, ganhou o nome da forma acaipirada com que os locais chamam o pequeno córrego que passa por ali.
Corguinho anda muito mudado. Nos últimos anos, os agricultores e as comunidades quilombolas que povoam a região de relevo acidentado, matas verdes e céu límpido têm recebido estranhas visitas.
O município de 4.370 habitantes, a 96 km da capital, Campo Grande, ganhou o nome da forma acaipirada com que os locais chamam o pequeno córrego que passa por ali.
Corguinho anda muito mudado. Nos últimos anos, os agricultores e as comunidades quilombolas que povoam a região de relevo acidentado, matas verdes e céu límpido têm recebido estranhas visitas.
Um grupo de ufologistas firmou pouso ali, com o objetivo de observar e contatar seres extraterrestres.
Em datas predeterminadas, excursões desembarcam centenas de curiosos, homens e mulheres de todas as idades e das mais variadas profissões, em busca de um contato imediato com os ETs.
Esse tipo de turismo ecoufológico não é novidade no Brasil. A diferença, asseguram os organizadores do chamado Projeto Portal - liderado por Urandir Fernandes de Oliveira, um paulista que se diz paranormal e traz no próprio nome o acrônimo UFO -, é que a atividade-fim ali é outra.
Eles estão determinados a erguer em pleno Centro-Oeste uma cidade-refúgio para a catástrofe planetária "prevista" no calendário maia para o ano de 2012 - tema do blockbuster hollywoodiano estrelado por John Cusack no ano passado.
Nós não estamos sós, é a mensagem que Urandir e seus seguidores querem passar ao mundo. Não são os únicos convictos, a julgar por uma pesquisa divulgada no último dia 8 pela agência Reuters.
Feita pelo instituto francês Ipsos em 22 países que representam 75% do PIB mundial, ela concluiu que um em cada cinco cidadãos do mundo (20%) acredita que seres alienígenas vieram à Terra e caminham entre nós disfarçados de seres humanos.
Como se o enredo da série cinematográfica Man in Black, com Will Smith e Tommy Lee Jones, transcorresse na vida real, das ruas.
Nos números do Ipsos, o Brasil, com 24%, aparece como o sexto país em que as pessoas mais acreditam na ideia, empatado com os Estados Unidos. Os campeões são Índia (45%) e China (42%).
"Eles são seres de outras dimensões e a sua forma, assim como a de suas naves, é energética", explica um dos associados mais antigos do grupo, o instrutor de voo gaúcho Alexandre de Oliveira, de 42 anos.
Embora nunca tenha visto um óvni durante o trabalho, Oliveira diz que sempre se impressionou com os relatos de "avistamento" feitos por colegas pilotos.
E, embora luzes misteriosas no céu já o tenham intrigado durante a infância, considera ter visto sua primeira nave "com certeza" em Corguinho, há cerca de dez anos. Hoje, afirma ter "contatos presenciais frequentes" com Ets.
"Não somos místicos, nem uma seita religiosa, mas um grupo de pesquisa sobre o tema", resume Oliveira, cujo discurso, assim como o de boa parte dos participantes, tempera referências a pirâmides egípcias ou civilizações maias e astecas com teorias da física quântica moderna, como a de supercordas - que sugeriu a existência de 11 dimensões no universo, além da realidade tridimensional a que estamos acostumados.
Tudo ao melhor estilo Eram os Deuses Astronautas?, best-seller do suíço Erich von Däniken que especulava, já em 1968, sobre a presença alienígena em registros de civilizações antigas.
Difícil é entender como tal elucubração teórica foi parar na cabeça do fundador do grupo, Urandir Fernandes, de 47 anos, um homem simples, de pouca educação formal e personagem tão pitoresco quanto controverso.
Filho de um pedreiro com uma dona de casa, Urandir nasceu em Marabá Paulista, no interior de São Paulo, em uma família de 11 irmãos.
Aos 4 anos, diz que foi surpreendido pelo pai acariciando uma cobra urutu-cruzeiro, sem ser picado. Manifestavam-se, pela primeira vez, seus poderes especiais.
Ganhou apelido de "Santinho" e fama de milagreiro. "Eu era tímido, quase não tinha amigos e os vizinhos vinham colocar as mãos em mim para se curar de doenças", diz.
Foi às vésperas de seu aniversário de 13 anos, que Urandir diz ter vivido sua experiência mais extraordinária.
"Eu nunca tinha tido uma festa e pedi para minha mãe um bolo e um sapato", conta. De noite, estava sozinho no quarto quando "uma luz violeta suave" surgiu.
Diz ter levitado e atravessado o telhado da casa como se aquele não existisse. Em seguida, viu-se no interior de uma nave espacial, deitado em uma maca.
"Na hora eu não estranhei, achei que fosse a festa que eles tinham me preparado." Ali, três seres com aparência humana, exceto pela íris dos olhos na vertical - "como um olho de gato" -, teriam colocado implantes em seu pescoço para amplificar suas habilidades paranormais.
"Eles disseram que tinha uma coisa importante para fazer e que fui escolhido por ter uma frequência cerebral acelerada, que favorece o contato com eles."
Trabalhando com o pai, percebeu ser capaz de entortar vergalhões de ferro sem fazer força. Em pouco tempo, passou a ganhar a vida fazendo shows no interior.
Nas apresentações, dobrava e rasgava moedas e entortava talheres, como o israelense Uri Geller.
Esteve em programas populares de televisão e participou de uma edição do Globo Repórter em 1995, movimentando objetos, ligando e desligando lâmpadas e aparelhos de TV "com a força do pensamento".
Em 2002, uma negociação para levá-lo a um desafio paranormal no laboratório do americano James Randi, na Flórida - que oferece US$ 1 milhão para qualquer um que prove ter poderes paranormais e desmascarou Thomas Green Morton, guru de artistas e políticos de Brasília -, não prosperou.
O psicólogo Jayme Roitman, que chegou a participar como consultor dessas reuniões, não se convenceu: "Não digo que Urandir seja charlatão, mas cabe a ele o ônus da prova dos poderes que alega ter".
Urandir afirma que a desistência não foi dele. Mas o site do ilusionista Thiago Neves, o Kronnus, representante de Randi no Brasil, registra que aguarda desde 2004 - há "5 anos, 6 meses e 14 dias" - para levá-lo aos EUA.
Representantes da Revista Brasileira de Ufologia também vêem com descrédito a linha direta que Urandir diz ter com gente de outro mundo.
Foi "por orientação dos seres" que Urandir diz ter obtido a propriedade onde está instalado o Complexo Turístico Zigurats, cujo nome faz referência à pirâmide de 38 metros de altura que será construída até o ano que vem.
São 1.042 hectares, 98 casas de alvenaria e 9 iglus que acolhem moradores e visitantes. Em cima de um morro foi construído um pequeno observatório, que vai ganhar um telescópio.
Tudo comprado, conforme diz, com a renda dos cursos e palestras que ministra nas principais capitais do País (que rendem cerca de R$ 4 mil cada), os pacotes de final de semana em Corguinho (de R$ 250 a R$ 400) e a mensalidade (R$ 40) dos cerca de mil associados, além de doações.
O que mais impressiona, no meio do nada, é a "centro de pesquisas", com computadores e oito antenas parabólicas para captar sinais via satélite do mundo todo.
"Imagine que quando chegamos aqui não tinha nem luz elétrica", conta o engenheiro e técnico em informática Alessandro Oliveira, de 39 anos, um dos responsáveis pelas instalações.
Ele deixou o emprego fixo no Tribunal de Justiça de Porto Alegre e mudou-se de mala e parabólica para Corguinho.
Nerd típico, conta que escalou o imponente morro de São Sebastião para instalar uma antena repetidora.
"Aqui, eu aprendo, crio e vivo uma aventura." Alessandro também desenvolveu o insólito projeto de construção de um "aerodisco", que será movido, conta, por uma tecnologia que será passada pelos ETs.
O centro inteiro, asseguram eles, é um "álibi para dar credibilidade" às informações que pretendem passar sobre 2012.
"Os terremotos, as inundações, a erupção do vulcão na Islândia que estamos vendo agora, são indícios de uma grande transformação pela qual o planeta vai passar", profetiza Urandir, para quem, diferentemente do ex-vice-presidente e militante verde americano Al Gore, a culpa não é do aquecimento global.
"É um ciclo natural, causado pelo alinhamento de galáxias, que vai alterar o eixo de inclinação da Terra."
E a área mais protegida para se enfrentar a tormenta é... o Centro-Oeste do Brasil. "Mas não será o fim do mundo", tranquiliza ele.
"A partir de 2018 as condições vão se estabilizar e uma ordem social mais evoluída será instalada no planeta."
Abduzidos pelo céu de Corguinho, repórter e fotógrafo do Aliás viram estrelas e luzes piscantes, mas nada que pudesse inequivocamente ser chamado de disco voador.
No ponto alto da viagem, acompanharam as 95 pessoas que iriam testemunhar o contato imediato de quarto grau (conversação direta) de uma família de Belo Horizonte - pai, mãe e filha de 12 anos - com um extraterrestre.
No meio da trilha escura, pouco antes das 5 da manhã, uma voz de tom infantil pediu que apenas a família se aproximasse. Luzes piscaram aqui e ali, no breu.
"É Bilu, um ser de Pégasus, da raça dos Laquins, de 1,40 m", informou Urandir. Os três degustaram "tabletinhos", a comida extraterrestre oferecida por Bilu, que sumiu em seguida. A reportagem, infelizmente, não teve direito a tabletinho nem prosa com o ET.
"Não queremos convencer ninguém. Cada um deve tirar as próprias conclusões", diz o advogado uruguaio Danilo Costalunga, de 40 anos.
Em março de 2000, foi ele quem defendeu Urandir, que ficou quatro dias preso em Porto Alegre, sob acusação de venda ilegal de terrenos em Corguinho. "O juiz arquivou o inquérito, nem houve processo.
O Portal é uma associação civil sem fins lucrativos." De profissional contratado, Costalunga se juntou ao grupo.
"Eu, que por ofício era uma pessoa para quem só valia o escrito, estou seguro da existência de outros mundos."
Para quem não acredita na profecia de 2012, Urandir dá de ombros. "Quando as coisas começarem a acontecer, as pessoas vão dizer: ‘Bem que aquele grupo de malucos dizia’". Quem viver, verá - nas ruas ou nas telas do cinema.
Fonte: Estadão
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