quarta-feira, 7 de março de 2012

Fantasmagorias da Várzea

Por Jaqueline Couto





Famoso pelo seu conteúdo histórico (foi o primeiro a ter suas terras repartidas entre os colonos portugueses na 1ª metade do século XVI) e pela arte colossal do mestre Brennand, o bucólico bairro da Várzea também tem seu lado digamos que... Assombroso.

Uma prova disso são os inúmeros relatos sobre vovós do além, escravos andarilhos e sinhás de tez delicada que caminham por varandas de casarios antigos...

Segundo maior em extensão territorial do Recife, com 2.264,0 hectares de área, a "Valzea", carinhosamente chamada pelos seus adoradores e freqüentadores como eu, também guarda seus mistérios.

Habitada primeiramente por engenhos-de-cana-de-açúcar, e atualmente por charmosas casinhas de ruelas tranquilas, o local até hoje, exibe seus fantasmas. Entre os mais conhecidos está o da "Velhinha da Sacola".

Esse espectro costuma aparecer para os mais afoitos que teimam em caminhar pelas ruas desertas do bairro a altas horas.

A simpática velhota surge, como quem não quer nada, carregando uma sacola grande e aparentemente pesada. Quem se aproxima e se oferece para levar a bolsa depara-se com seu súbito desaparecimento e o surgimento de uma inusitada situação: a sacola abandonada e...cheia de ossos humanos.

Outra estripulia de nossos fantasmas varzeanos é o aparecimento de mais uma velhinha que, segundo informações de moradores, costuma apanhar quem, também, perambula por aí voltando da faculdade ou de algum outro lugar.

A singular e carente aparição vem de braços abertos louca para dar um daqueles abraços apertados que as avós nos dão quando nos encontram depois de um longo período de ausência. Seria a pavorosa encanecida um espectro "morto" de saudade dos netinhos? Quem quiser que faça as suas apostas.

Uma outra historieta é sobre um antigo e abandonado casarão na Praça da Várzea, conhecido por seus barulhos ensurdecedores de móveis caindo no meio da noite e de uma aparição nada desagradável: quem tem sorte, presencia uma adorável sinhazinha a desfilar pelo terreno da residência em trajes antigos e suntuosos.

Há quem diga que, ao som de gracejos, a jovem sorri e desaparece, deixando um aroma de flores à sua volta.

Chegou aos nossos ouvidos uma ocasião em que um atrevido mancebo das bandas da Brasilit estava a passear pelos arredores da casa para sondar o local e ver se conseguia ver a adorável moçoila.

Qual não foi seu desespero quando, do nada, as portas abriram-se e uma terrível ventania saiu de dentro da residência alçando o nobre rapaz. Ele, claro, não ficou para ver quem soprava...

Um colégio local é outra fonte inesgotável de aparições. Existe quem já tenha visto, caminhando em suas dependências, uma freirinha com ares pensativos.

Será que estava a calcular qual seria o próximo aluno a levar umas belas bordoadas da palmatória? Bom. Não sabemos.

Enquanto deixamos nossos leitores a pensar no assunto apresentamos mais um testemunho: o aparecimento de negros quase desnudos e ainda presos a correntes caminhando pelas ruas desertas do bairro de forma arrastada e triste.

Manifestações de um passado doloroso impregnado no ar ou uma desesperada tentativa de avisar ao mundo dos vivos que o outro lado existe e não esqueceu o que sofreu nos pelourinhos dos grandes engenhos? Quem o sabe?

Encurtando nosso relato, mais uma: quem mora nas imediações da Igreja do Rosário, datada do século XVII, já deve ter ouvido o caso em que escavações recentes desenvolvidas sob a orientação do Departamento de Arqueologia da Universidade Federal de Pernambuco, encontraram o cemitério das vítimas das duas batalhas dos Montes Guararapes (1648 e 1649).

Entre eles, o de uma donzela ainda em vestes de casamento. E, quem passava por perto da parede onde jaziam os corpos, jurou que ouviu um choro de mulher, muito triste e sentido, igual ao de moça abandonada no altar.

Bem, quem foram ou o que querem os fantasmas varzeanos nem sempre legitimamente pernambucanos, não sabemos.

O que realmente nos interessa é poder continuar a contar as histórias que povoam não só o imaginário popular recifense, mas, também, as ruas e bairros da considerada Escócia brasileira.

Isso, graças aos seus inúmeros e incansáveis fantasmas que deixam nossos dias mais instigantes e nossas noites apavorantes.





Fonte:
Histórias Medonhas

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