Sem desfecho, crime continua sendo um mistério.
Filha é a principal suspeita da morte dos pais. Há quem diga que
elevador volta e meia vai parar no sexto andar, sem ninguém apertar o
botão.
Adriana Villela tem 51 anos e possui graduação em Arquitetura e
Urbanismo pela Universidade de Brasília (UnB). A arquiteta também é
mestre em Desenvolvimento Sustentável. Hoje, ela mora no Rio de Janeiro e
atua principalmente nos seguintes temas: reciclagem de vidro,
sustentabilidade e seguidas tentativas de provar sua inocência.
Em 2009, Adriana foi apontada como a principal suspeita pela morte
dos seus pais, José Guilherme Villela, de 73 anos, a também advogada
Maria Carvalho Villela, de 68, e a empregada deles, Francisca Nascimento
da Silva, de 58. Desde então, tornou-se figura central em uma história
que tem até vidente. Menos desfecho.
Seis anos após o triplo homicídio na 113 Sul, o caso permanece
obscuro. Apontada pelo Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT)
como mandante do assassinato dos pais e da empregada deles, Adriana
Villela ainda luta para provar a consistência de sua versão.
Tanto ela quanto Paulo Cardoso, acusado de participação nas mortes,
aguardam julgamento no tribunal do júri popular. E, vale lembrar, a ela
ainda cabem mais recursos. Seu advogado, Antônio Carlos de Almeida
Castro, Kakay, assegura que o álibi da arquiteta é inquestionável e diz:
“Acho que estamos no melhor momento do processo”.
Enquanto isso, Adriana vive entre a sombra de ser a principal
suspeita da morte dos pais e a aparente saudade deles. No Facebook, a
filha do ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) coloca
imagens de praias, viagens, amigos e, inclusive, dos pais.
Em maio, ela chegou a postar uma foto de sua mãe. “Vai ser bonita
assim lá em casa, mãe”, escreveu. Em outros momentos, defende-se das
acusações. “Nenhuma calúnia, por maior que seja, pode calar a semente
dessa verdade viva em mim”, publicou.
Longe da cena do crime que chocou a capital federal pela crueldade,
Adriana parece tentar reconstruir sua vida. De acordo com o advogado da
arquiteta, hoje, ela vive de forma simples.
Fé
“Costumo dizer que Adriana morreu duas vezes: quando viu a morte de
seus pais, com facadas, de uma forma terrível e, depois, quando foi
acusada de forma irresponsável”, salienta Kakay. “Ela tem o temperamento
próprio dos pais dela. Está com bastante fé no julgamento. É uma pessoa
independente. Optou por sair de Brasília até o julgamento”, afirma
ainda. “Temos convicção de provar inocência dela”, salienta.
Em abril deste ano, a 1ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do DF
julgou recurso de Adriana e Paulo Cardoso. Na sessão, garante Kakay,
foram apresentadas provas que contrariam as versões dadas pelos outros
envolvidos, que apontam para a culpa de Adriana.
Reconstituição
“Conseguimos reconstituir o dia desde a hora em que ela acordou até a
hora em que voltou pra casa. Inclusive, através de provas testemunhais.
Tinha gente que viu ela no curso, que esteve com ela na casa de uma
amiga. E, também, pelo cartão de crédito, que comprovou que, naqueles
horários, ela estava na padaria. Nos lugares em que ela sempre disse que
esteve. Conseguimos fazer uma prova negativa”, explica o advogado.
Segundo ele, o Ministério Público partiu do pressuposto de que
Adriana poderia até ter almoçado na casa dos pais no dia do crime, em 28
de agosto de 2009. “E, inclusive, a prisão dela na primeira vez foi
porque eles disseram que ela não tinha álibi às 22h naquele dia”. No
entanto, salienta, “nós conseguimos localizar um e-mail que ela passou
de casa às 22h17”.
Memória
Em 31 de agosto de 2009, um forte cheiro tomava conta dos corredores
do sexto andar do bloco C da 113 Sul. O odor ainda vive na memória de
muitos moradores. Na época, o zelador chegou a sugerir ao síndico que
trocasse de desinfetante, na tentativa de sanar o problema.
Na mesma data, a neta do casal, Carolina, decidiu ir à casa dos avós,
que não atendiam ao telefone. Acompanhada de três amigos policiais, ela
chamou o chaveiro, abriu a porta e encontrou os corpos de Maria, José
Guilherme e Francisca. O cheiro que tomava conta do andar vinha deles,
assassinados três dias antes, em 28 de agosto.
Segundo laudo do Instituto Médico-Legal (IML), foram 78 facadas. A
empregada da família, Francisca, levou 23 golpes nas costas. Maria,
agarrada por trás, teria levado 12 punhaladas. José Guilherme recebeu o
maior número: 38 ao todo.
Da casa, os criminosos roubaram dinheiro e jóias que a família
escondia em caixas de uísque e fundos falsos de armários. Mesmo assim,
eles deixaram para trás quase US$ 100 mil, achados na perícia.
"Prova negativa dos fatos"
No julgamento, conta ainda o advogado Antônio Carlos de Almeida
Castro, o desembargador Mário Machado divergiu dos outros julgadores em
relação à pronúncia da arquiteta. “Ele é uma pessoa muito respeitada. É
muito técnico. E nós fizemos a prova negativa dos fatos”, salienta.
No site do Tribunal de Justiça, a sessão é descrita em uma matéria do
dia 23 de abril deste ano. Nela, é possível constatar o posicionamento
de Mário Machado.
“Ele concluiu que a defesa de Adriana conseguiu fazer a prova
negativa dos fatos, demonstrando por meio de documentos, obtidos por
meio das quebras dos sigilos bancário, telefônico, bem como de
testemunhos em juízo, que a ré não estava no apartamento dos pais no
momento do crime e que não fez contato telefônico com Leonardo no dia
dos fatos", narra a publicação.
Para o Ministério Público, que sustenta a acusação de Adriana, os
principais indícios contra ela são o depoimento de testemunhas e duas
cartas encontradas pela polícia em que Adriana rompe relações com Maria
Villela.
As desavenças entre mãe e filha seriam causadas por “conflitos por
dinheiro”. Com 45 anos, a arquiteta ainda dependia de uma mesada de R$ 8
mil para pagar suas contas pessoais. Por conta disso, Maria deixava
claro o que esperava da filha, reprovava algumas amizades e o suposto
uso de maconha.
Amigos e vizinhos
Além dos familiares, os amigos de Adriana dão total apoio à versão
que ela sustenta. Nas vezes em que expõe o caso no Facebook, alguns
comentam e dizem ter certeza de que a arquiteta jamais mandaria matar
seus pais e a empregada da casa.
No entanto, o mesmo posicionamento não é mantido por aqueles que
foram vizinhos dos pais de Adriana. No bloco C da quadra 113 Sul, apesar
da discrição, é evidente que o triplo homicídio mexeu com a vida de
todos. Agora, para entrar nas portarias que dão acesso aos apartamentos,
é necessário passar pelo arsenal de segurança, que exige o
reconhecimento de digitais.
Revolta dos moradores
Os moradores, que preferem não comentar oficialmente os assassinatos,
deixam escapar a revolta por verem a filha do casal Villela ainda
solta. “Não quero comentar sobre isso porque não acredito mais na
Justiça”, diz um senhor.
Uma senhora vê a equipe do Jornal de Brasília e diz em voz alta: “Já
faz seis anos que isso aconteceu e nada foi feito. É um trauma para
todos. Mostra que dinheiro compra a Justiça”.
Apartamento vazio e mal-assombrado
Um dos porteiros do prédio, Marcus, que já trabalhava no local na
época do crime, não diz nada. Segundo ele, o que todos sabem é o que a
mídia mostra. O apartamento dos Villela, garante, continua igual. Porém,
vazio. Do alto do prédio, claramente dá para ver que o imóvel está
totalmente desocupado.
Há rumores de que Adriana retirou todos os móveis do apartamento. A
informação, contudo, também não foi confirmada pelo porteiro e nem pelo
síndico, que preferiu não estender o assunto. São muitas dúvidas, muitas
supostas verdades e poucos esclarecimentos. Na mesma tragédia em que
até uma “adivinha” foi protagonista, não faltam elementos de um filme de
suspense.
Passos pela casa
Há quem diga que os passos de Maria dentro de casa ainda podem ser
ouvidos. A advogada costumava usar tamanco dentro do apartamento.
Sussurros, vultos e um elevador que, volta e meia, vai parar no sexto
andar, sem ninguém apertar o botão.
“Já aconteceu comigo e mais de uma vez”, diz uma moradora do prédio.
Dizem até que a própria Adriana teria levado um padre para benzer o
apartamento 601/2. Nada incomum para uma história cuja vidente, agora,
caça fantasmas.
Poderes paranormais
Rosa Maria Jaques, a vidente que na época previu, com seus poderes
paranormais, onde estavam as peças fundamentais para o esclarecimento do
crime, hoje tem uma empresa de caça fantasmas.
Durante as investigações, ela disse à delegada Martha Vargas, que
cuidava do caso, ter recebido do mundo dos espíritos a missão de
ajudá-la.
"Visão" atrapalha o caso
No mesmo dia em que a vidente Rosa Maria Jaques disse à delegada
Martha Vargas, que cuidava do caso, ter recebido do mundo dos espíritos a
missão de ajudá-la, ela, a delegada, o marido dela, e o agente policial
José Augusto Alves foram ao apartamento do casal Villela. Lá, a mulher
afirmou ter tido uma visão: descobriu onde morava o assassino.
A história, porém, caiu por água abaixo. Tudo não passou de uma
armação para atrapalhar o esclarecimento do caso. Segundo a polícia,
Rosa Maria Jaques embarcou no aeroporto de Brasília dois meses depois do
crime e só foi falar com a então delegada do caso dez dias depois.
De acordo com a polícia, a vidente se encontrou com Adriana Villela,
filha do casal assassinado, para combinar a farsa. As duas negam o
encontro. Mas uma testemunha teria afirmado que elas tinham até uma
“certa intimidade na conversa”.
Suspeitas
Passados seis anos do triplo homicídio, nem a vidente e nenhum dos
envolvidos conseguem desfazer as suspeitas que pairam sobre eles.
Segundo o promotor de Justiça, agora responsável pelo caso, Marcelo
Leite, de fato, não há prova que conduza Adriana à inocência.
Para ele, as provas apresentadas no último julgamento de recurso, em
abril, não são incontestáveis. “Isso não é verdade. Eles (defesa de
Adriana) tentaram produzir uma contraprova. Mas a principal prova é a
delação dos réus, gravadas e filmadas. E tem a relação conflituosa que
ela tinha com a mãe”, salienta Marcelo Leite.
O promotor lembra ainda que dois dos réus, Leonardo Alves e Francisco
Aguiar, já foram condenados a 60 e 55 anos de reclusão,
respectivamente.
“Gente rica”
“O Leonardo seria o articulador, que teria, em contato com Adriana,
trazido os executores, que são Francisco e Paulo”. Agora, ressalta: “O
processo do Paulo já está pronto para ir para julgamento. E o da
Adriana... Advogado rico. Nos processos de gente rica, os recursos
parecem intermináveis”, diz.
O advogado de Adriana Villela diz que não pode responder se o
inventário da família foi fechado ou não. Não é ele quem cuida disso,
afirmou. No entanto, para o promotor de Justiça, é provável que a
herança já tenha, sim, sido dividida entre Adriana e o irmão, Augusto
Villela. “Não posso lhe dar certeza. Mas imagino que já terminaram o
inventário. Para ela ficar impedida, precisaria de ação de indignidade”,
esclarece.
A ação de indignidade, explica ainda, é o meio pelo qual os herdeiros
podem excluir o(s) outro(s) da partilha da herança. “No Brasil, o
Ministério Público não tem legitimidade para ação de indignidade. E,
como o irmão aparenta apoiá-la, enquanto ele estiver apoiando, ela vai
receber a herança e, inclusive, pagar o advogado dela com isso”, afirma o
promotor.
Disputa de egos nas investigações
Na tentativa de descobrir o quanto antes os culpados pelo crime, a
Polícia Civil criou um trabalho em conjunto com três unidades policiais.
A ideia, no entanto, não deu certo.
As investigações do triplo homicídio deixaram em evidência três
delegadas da corporação. Martha Vargas, ex-chefe da 1ª Delegacia de
Polícia (Asa Sul), Mabel de Faria, diretora da Coordenação de
Investigação de Crimes contra a Vida (Corvida), e Deborah Menezes, na
época à frente da 8ª DP.
Estranhamento
Em menos de um mês, Martha e Mabel se estranharam. A força-tarefa se
dissolveu de vez com a soltura de três suspeitos – por falta de provas –
que haviam sido detidos pela ex-titular da 1ª DP. Com isso, Martha saiu
do caso, que passou a ser exclusividade da Corvida.
Em dezembro de 2009, o então responsável pela unidade especializada
em elucidação de homicídios, delegado Luiz Julião Ribeiro, deixou o
inquérito com Mabel.
As desavenças internas se tornaram públicas com uma investigação
paralela conduzida inesperadamente pela 8ª Delegacia de Polícia, no SIA.
Em novembro de 2010, a titular da unidade, delegada Deborah Menezes
prendeu, em Minas Gerais, o ex-porteiro Leonardo Campos Alves.
Martha acabou exonerada da corporação, com a suspeita, inclusive, de mudar o rumo das investigações para favorecer Adriana.
Hoje, Martha está aposentada, segundo informou a Divisão de
Comunicação da Polícia Civil do Distrito Federal. Débora também se
aposentou. Mabel é hoje diretora do Departamento de Polícia
Especializada (DPE).
Como estão os envolvidos hoje
Adriana Villela – Mora no Rio de Janeiro, aguarda julgamento no
tribunal do júri. No entanto, ainda cabem mais recursos em seu processo.
Paulo Cardoso – Está preso. Ele também aguarda julgamento no tribunal do júri. É sobrinho do ex-porteiro Leonardo Campos Alves.
Leonardo Alves – Foi julgado em 2013. O ex-porteiro pegou pena de 60
anos em regime inicial fechado pelos três homicídios e por furto
qualificado.
Francisco Mairlon Barros – Comparsa de Leonardo e Paulo, foi
condenado, também em 2013, a 55 anos pelos três homicídios e furto
qualificado.
Rosa Maria Jaques – A vidente chegou a ser detida em 2010 por
suspeita de tentar atrapalhar as investigações abertas com as mortes.
Hoje, vive em Porto Alegre e se diz investigadora paranormal na empresa
“Visão Paranormal Caça Fantasmas Brasil”.
Fonte: Jornal de Brasília
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