O ratinho redescoberto por um trio de pesquisadores no topo das
montanhas em forma de mesa da Amazônia não é tão espetacular quanto os
habitantes dessa área imaginados pela ficção, como dinossauros e aves
gigantes. Mas é igualmente fascinante do ponto de vista evolutivo. É que, a rigor, o pequeno Podoxymys roraimae não "deveria" estar ali.
Uma análise de DNA confirmou que o bicho pertence a uma linhagem totalmente diferente das dos roedores amazônicos.
Seus parentes mais próximos (que nem são tão próximos assim) estão no
cerrado, a milhares de quilômetros dali. A separação entre eles teria se
dado há cerca de 3 milhões de anos, quando os ancestrais do homem ainda
não passavam de macacos bípedes.
"Para esse grupo de animais, a divergência é bastante grande", diz o
zoólogo Marcelo Weksler, da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz). "As
características morfológicas dele são bem distintas, e acabam sendo
parecidas com as de animais que têm parentesco ainda mais distante com
ele."
Weksler, junto com Yuri Leite, da Universidade Federal do Espírito
Santo, e Philippe Kok, do Real Instituto Belga de Ciências Naturais, é
coautor do estudo sobre a redescoberta do ratinho que acaba de sair na
revista científica "Journal of Biogeography".
SUMIDO
O P. roraimae é tão esquivo que, apesar de ter sido descrito
originalmente em 1929, menos de dez exemplares foram capturados desde
então, e fazia um quarto de século que ninguém botava os olhos no bicho,
fazendo dele um dos mamíferos mais raros da Terra.
Antes da nova pesquisa, todos os espécimes conhecidos tinham sido
achados no topo do monte Roraima, que fica na fronteira entre o Estado
brasileiro de mesmo nome, a Venezuela e a Guiana.
O monte é um dos célebres "tepuis", elevações de topo achatado típicas
da região que foram usados como cenário para "O Mundo Perdido", história
sobre dinossauros ainda vivos nos tempos modernos escrita por Arthur
Conan Doyle (o criador de Sherlock Holmes), e para a animação "Up –
Altas Aventuras".
No mundo real, os "tepuis" de fato possuem uma biodiversidade única, em
especial quando o assunto são plantas, anfíbios, répteis e aves, mas o P. roraimae é um dos poucos mamíferos que só existem lá.
O rato encontrado pelos pesquisadores estava em outro "tepui": o monte Wei-Assipu, vizinho ao Roraima.
Ele foi capturado por Kok a 2.216 m de altitude, por acaso, já que ele é
herpetólogo (especialista em anfíbios e répteis). "Ele enviou o
exemplar para o Yuri, com quem já tinha trabalhado antes, e aí fui
chamado para participar do estudo como especialista em roedores", conta
Weksler.
Kok conseguiu fazer a primeira foto de um membro da espécie ainda vivo
(o ratinho acabou morrendo logo depois, infelizmente). O grupo também
foi o primeiro a fazer uma análise genética do roedor, comparando
trechos de seu DNA com os de várias outras espécies sul-americanas.
Uma possibilidade que explicaria a chegada do bicho aos "tepuis" seria a
existência de conexões, há milhões de anos, entre a vegetação de áreas
do cerrado que são elevadas e as áreas montanhosas da Amazônia. Ainda é
cedo para dizer como exatamente isso se deu, no entanto.
O P. roraimae mede apenas 20 cm (incluindo a cauda) e parece
estar adaptado a viver em tocas no chão e a comer um pouco de tudo,
embora não haja dados concretos sobre seus hábitos. De qualquer modo,
com habitat tão restrito e com o risco de as mudanças climáticas
afetarem esse ambiente, o bicho já está na lista mundial de espécies
ameaçadas.
Fonte: Folha de São Paulo
Um comentário:
Ha, ha, ha. Moro em Belém, e há um monte desses ratos perto de casa. Meu pai chama eles de "ratos do mato" e diz ser estranho eles estarem em plena cidade. Não sabia que eles eram tão importantes... Já até matei uns e tenho agora um gato que mantem eles longe.
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